sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Mario Quintana: A Casa Fantasma

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

Com três poemas do mestre da simplicidade, o eterno Mario Quintana (1906-1994), encerro esta série que buscou regatar a memória afetiva e lúdica de alguns autores que praticaram sua bela poesia em língua portuguesa. Embora menosprezada pela Academia Brasileira de Letras, a obra universal do premiado Quintana deve ser apreciada sem moderação por qualquer público leitor. Se anteontem você viajou de trem no seu convidativo Poema Transitório! Se ontem conheceu Uma Historinha Mágica muito criativa! Hoje vai se emocionar com a imensa sensibilidade de Mário Quintana no seu pertinente poema A Casa Fantasma. O cinza afrontando o azul. O concreto cobrindo o verde. O desenvolvimento urbano massacrando o pertencimento humano. O clamor do poeta colocando o leitor diante da beleza do intangível.


                    

A Casa Fantasma
Mario Quintana
                                                    
A casa está morta?
Não: a casa é um fantasma,
um fantasma que sonha
com a sua porta de pesada aldrava,
com os seus intermináveis corredores
que saíam a explorar no escuro os mistérios da noite
e que as luas, por vezes,
enchiam de um lívido assombro...
Sim!
agora
a casa está sonhando
com o seu pátio de meninos pássaros.
A casa escuta... Meu Deus! a casa está louca, ela não
             [sabe
que em seu lugar se ergue um monstro de cimento e
             [aço:
há sempre uma cidade dentro de outra
e esse eterno desentendido entre o Espaço e o Tempo.
Casa que teimas em existir
a coitadinha da velha casa!
Eu também não consegui nunca afugentar meus
           [pássaros.

*
ilustração de Joba Tridente.2016


Mario de Miranda Quintana (Alegrete-RS: 30.07.1906 –Porto Alegre-RS: 05. 05.1994), jornalista, tradutor, poeta (maior) brasileiro. O “poeta das coisas simples”, o “prosador” do cotidiano, traduziu Marcel Proust, Virgínia Wolf, Giovanni Papini, Honoré Balzac, Voltaire, Graham Greene, Joseph Conrad, Guy de Maupassant, Aldous Huxley, Somerset Maugham, entre outros mestres da literatura universal. Amado por uma grande legião de fãs no Brasil e exterior, mas menosprezado pela Academia Brasileira de Letras, o premiado escritor lançou o seu primeiro livro de poesias, A Rua dos Cataventos, em 1940. Quintana trabalhou na Editora Globo e no jornal Correio do Povo. Para saber mais da sua fascinante biografia e extensa bibliografia, sugiro a leitura de Jornal de Poesia: Mario Quintana; Releituras: Mario Quintana; Antonio Miranda: Mario Quintana. Wikipédia: Mario Quintana.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Mario Quintana: Uma Historinha Mágica

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

Com três poemas do mestre da simplicidade, o eterno Mario Quintana (1906-1994), encerro esta série que buscou regatar a memória afetiva e lúdica de alguns autores que praticaram sua bela poesia em língua portuguesa. Embora menosprezada pela Academia Brasileira de Letras, a obra universal do premiado Quintana deve ser apreciada sem moderação por qualquer público leitor. Se ontem você viajou de trem no seu convidativo Poema Transitório. Hoje, diretamente das páginas do aclamado Baú de Espantos (1986), conhece Uma Historinha Mágica..., mágica e encantadora! Amanhã fecho o mês com Quintana falando do (que nos parece) intangível.


         

Uma Historinha Mágica
Mario Quintana

para Lili

Era um burrinho azul, vindo do céu
Via-o de madrugada no meu sonho...
E eu sempre lhe servia, em meu chapéu,
bolas-de-inhaque feitas de arco-íris!

Nunca as achei por isso nos bazares
quando a cidade despertava, exata,
e só restava da Cidade Oculta
um passo leve de menina-flor...

E era um menino preguiçoso e triste
e quando ele sorria por acaso
ninguém lhe fosse perguntar por quê!

Ele sabia histórias sem enredo
pois não queria que acabassem nunca
- Era um burrinho... uma menina... e...

*
ilustração de Joba Tridente.2016


Mario de Miranda Quintana (Alegrete-RS: 30.07.1906 –Porto Alegre-RS: 05. 05.1994), jornalista, tradutor, poeta (maior) brasileiro. O “poeta das coisas simples”, o “prosador” do cotidiano, traduziu Marcel Proust, Virgínia Wolf, Giovanni Papini, Honoré Balzac, Voltaire, Graham Greene, Joseph Conrad, Guy de Maupassant, Aldous Huxley, Somerset Maugham, entre outros mestres da literatura universal. Amado por uma grande legião de fãs no Brasil e exterior, mas menosprezado pela Academia Brasileira de Letras, o premiado escritor lançou o seu primeiro livro de poesias, A Rua dos Cataventos, em 1940. Quintana trabalhou na Editora Globo e no jornal Correio do Povo. Para saber mais da sua fascinante biografia e extensa bibliografia, sugiro a leitura de Jornal de Poesia: Mario Quintana; Releituras: Mario Quintana; Antonio Miranda: Mario Quintana. Wikipédia: Mario Quintana.

quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Mario Quintana: Poema Transitório

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

Com três poemas do mestre da simplicidade, o eterno Mario Quintana (1906-1994), encerro esta série que buscou regatar a memória afetiva e lúdica de alguns autores que praticaram sua bela poesia em língua portuguesa. Embora menosprezada pela Academia Brasileira de Letras, a obra universal do premiado Quintana deve ser apreciada sem moderação por qualquer público leitor. Confira, hoje, o seu delicioso Poema Transitório, presente no aclamado Baú de Espantos (1986). Uma preciosidade para todos aqueles que sabem que viajar de trem é dar trilhos e trilhos à imaginação. Amanhã e depois tem mais...


                   

Poema Transitório
Mário Quintana

Eu que nasci na Era da Fumaça: - trenzinho
vagaroso com vagarosas
paradas
em cada estaçãozinha pobre
para comprar
pastéis
pés-de-moleque
sonhos
principalmente sonhos!
porque as moças da cidade vinham olhar o trem passar:
elas suspirando maravilhosas viagens
e a gente com um desejo súbito de ali ficar morando
sempre... Nisto,
o apito da locomotiva
e o trem se afastando
e o trem arquejando
é preciso partir
é preciso chegar
é preciso partir é preciso chegar... Ah, como esta vida é
                 [urgente!
no entanto
eu gostava era mesmo de partir...
e - até hoje - quando acaso embarco
para alguma parte
acomodo-me no meu lugar
fecho os olhos e sonho:
viajar, viajar
mas para parte nenhuma...
viajar indefinidamente...
como uma nave espacial perdida entre as estrelas.

*
ilustração: arte/recorte/fotomontagem de Joba Tridente.2016
foto do trem: IBGE. 


Mario de Miranda Quintana (Alegrete-RS: 30.07.1906 –Porto Alegre-RS: 05. 05.1994), jornalista, tradutor, poeta (maior) brasileiro. O “poeta das coisas simples”, o “prosador” do cotidiano, traduziu Marcel Proust, Virgínia Wolf, Giovanni Papini, Honoré Balzac, Voltaire, Graham Greene, Joseph Conrad, Guy de Maupassant, Aldous Huxley, Somerset Maugham, entre outros mestres da literatura universal. Amado por uma grande legião de fãs no Brasil e exterior, mas menosprezado pela Academia Brasileira de Letras, o premiado escritor lançou o seu primeiro livro de poesias, A Rua dos Cataventos, em 1940. Quintana trabalhou na Editora Globo e no jornal Correio do Povo. Para saber mais da sua fascinante biografia e extensa bibliografia, sugiro a leitura de Jornal de Poesia: Mario Quintana; Releituras: Mario Quintana; Antonio Miranda: Mario Quintana. Wikipédia: Mario Quintana.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Francisco Joaquim Bingre: Primavera

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

Conhecia a obra do escritor português Francisco Joaquim Bingre (1763-1856) através da Antologia Poética Toda Poesia, organizada por Iba Mendes. Autor de uma obra vastíssima, contemporâneo de Bocage e um dos fundadores da Nova Arcádia de Lisboa, Bingre encerra uma ternura irresistível em seu soneto Primavera. Creio que de todos os autores que estou publicando neste mês, seja aquele que mais fundo mergulhou em suas memórias afetivas e lúdicas. Um poema que me fez pensar se hoje em dia alguém ainda usa as estações do ano para expressar as fases da vida: primavera = infância, verão = juventude, outono = adulta, inverno = velhice. Amanhã e por mais dois dias, a simplicidade do meste Mario Quintana (1906-1994).



P R I M A V E R A
Francisco Joaquim Bingre

Passei a Primavera de meus anos
Com maternais desvelos amorosos.
Com meiguices, afagos carinhosos,
Com mimos de solícitos afanos.

Desenfaixado dos primeiros panos,
Pus-me em pé, dei passinhos vagarosos,
Logo corridas, saltos brincalhosos,
Travessuras de meninais enganos.

Nesta idade infantil da Primavera,
Com outros meus iguais brincões folgava.
Ah, quão gostoso, então, o tempo me era!

Inocente brincar só me encantava:
Feliz, se aqui ficando eu conhecera
A força do prazer que desfrutava!

*
ilustração de Joba Tridente.2016


Francisco Joaquim Bingre (São Tomé de Canelas-Portugal: 09.07.1763 - Lisboa-Portugal: 23.06.1856), poeta arcádico e pré-romântico português, foi um dos fundadores da Academia de Belas Letras, também conhecida como Nova Arcádia de Lisboa, assinando com o pseudônimo de Francélio Voiuguense. A sua vasta obra literária é composta de sonetos, odes, sátiras, madrigais, farsas, elegias, fábulas cançonetas, epístolas, hinos. Saber mais: Biografia de Francisco Joaquim Bingre; Francisco Joaquim Bingre; Poemas de Francisco Joaquim Bingre.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Emiliano Perneta: Iguassú

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

O escritor paranaense Emiliano Perneta (1866-1921), um dos criadores do simbolismo brasileiro, reverenciado como o Príncipe dos Poetas Paranaenses, teve grande presença na ebulição literária de sua época. O bonito soneto Iguassú (em língua guarani significa “rio grande”) é uma exaltação ao rio da sua infância que, mesmo sofrendo com a poluição de suas águas, alimenta as Cataratas do Iguaçu, consideradas uma das 7 Maravilhas Naturais do Mundo. A memória afetiva de Emiliano ressalta um tempo que dificilmente voltará, quando o rio cristalino, com seus encantos naturais, só incomodava os ribeirinhos na enchente. Amanhã escritor português Francisco Joaquim Bingre (1763-1856) traz o registro de sua mais antiga memória afetiva e lúdica.



I g u a s s ú
Emiliano Perneta
ao Joaquim de Castro

Ó rio que nasceu, onde nasci, ó rio
Calmo da minha infância, ora doce, ora má,
Belo estuário azul, espelhado e sombrio,
Quanto susto me deu, quanto prazer me dá!

Quantas vezes eu só, nessas manhãs d’estio,
Ao vê-lo deslizar, pomposamente, lá,
Pálido não fiquei, tão majestoso vi-o,
Orgulho do Brasil, gloria do Paraná!

Companheiro ideal! Durante toda a viagem,
Foi o espelho fiel a refletir a imagem,
Dos montes e dos céus, discorrendo através

Da floresta, ora assim como um cão veadeiro,
A fugir, a fugir alegre e alvissareiro,
Ora deitado aqui, quase a lamber-me os pés!

*
ilustração de Joba Tridente.2016


Emiliano David Perneta (Pinhais-PR: 03.01.1866 - Curitiba-PR: 19.01.1921), advogado, jornalista e escritor brasileiro, foi um dos criadores do simbolismo no Brasil e divulgador da literatura de Baudelaire. Seus primeiros poemas foram publicados em O Dilúculo (1883). Em São Paulo, no ano de 1888, juntamente com Afonso de Carvalho, Carvalho Mourão e Edmundo Lins, fundou a Folha Literária, ano em que publicou Músicas (versos parnasianos) e o panfleto Carta à Condessa D'Eu. Dirigiu, em companhia de Olavo Bilac, Vida Semanária e colaborou com o Diário Popular, Gazeta de São Paulo e Folha Popular, onde publicou a manifestações iniciais do movimento simbolista. Em Curitiba, onde exerceu também o magistério, criou a revista simbolista Victrix (1892)., publicou em 1913 o libreto Papilio Innocentia, , baseado no romance Inocência, do Visconde de Taunay, para a ópera do compositor suíço Léo Kessler. Emiliano Perneta, um dos fundadores do Centro de Letras do Paraná (1912) e considerado o Príncipe dos Poetas Paranaenses, é autor de Músicas (1888); Carta à Condessa D'Eu (1889); O Inimigo (prosa dramática - 1889); Alegoria (prosa dramática - 1903); Papilio Innocentia (1913); A Vovozinha (libreto de ópera infantil- 1917);  Ilusão (1911); Pena de Talião (1914); Setembro (1934), Poesias Completas (1945). Saber mais: Domingos Van Erven: Emiliano Perneta, Poeta ansioso pela revelação do mistério e A Poesia de Emiliano Perneta; Ivan Justen: Emiliano Perneta: Vida e Poesia de Província?. Há outras matérias sobre o autor, na web.

domingo, 25 de setembro de 2016

Luiz Guimarães Junior: O Jaguar

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

Luiz Guimarães Junior (1845-1898), de quem já publiquei anteriormente três obras-primas: A Morte da Águia; O Viajante e Idílio, é uma (re)descoberta tardia minha. A cada (re)leitura a sua obra se torna mais  apaixonante. Gosto do seu exotismo, da sua narrativa romântica e de expressividade rara. Em Sonetos e Rimas (1880) encontrei O Jaguar..., pode não se encaixar no propósito desta série que explora a memória afetiva e ou lúdica de autores em língua portuguesa, mas é de uma beleza tão desconcertante, que não pude deixar de fora. Amanhã é a vez do escritor paranaense Emiliano Perneta (1866-1921).



O Jaguar
Luiz Guimarães Junior

Rosna o fulvo jaguar, triste e dormente,
No seio da floresta: – a fera inteira
Dobra à velhice, e a névoa derradeira
Cobre-lhe a fauce lívida e impotente.

O imundo inseto, a mosca impertinente
Zumbe-lhe em torno; – a cobra traiçoeira
Fere-lhe a cauda inerte, e a aventureira
Formiga morde-o calma e indiferente.

Apenas quebra o sono mortuário
Do velho herói o grito, entre as folhagens,
Do cordeiro medroso e solitário;

Ou, através das tropicais aragens,
O tropel afastado, intenso e vário
Dum rebanho de búfalos selvagens.

*
ilustração de Joba Tridente.2016


LUIZ Caetano Pereira GUIMARÃES JÚNIOR (Rio de Janeiro-RJ: 17.02.1845 – Lisboa-Portugal: 20.05.1898): advogado, diplomata, escritor (de verso e prosa), jornalista e teatrólogo brasileiro. Graduado pela Faculdade de Direito do Recife, seguiu a carreira diplomática, servindo em Santiago do Chile, Roma e Lisboa..., onde, ao se aposentar, fixou moradia e desfrutou da prazerosa companhia de Eça de Queirós, Ramalho Ortigão, Guerra Junqueiro, Fialho Almeida. Guimarães Júnior foi membro fundador da Academia Brasileira de Letras e colaborador de diversos veículos de comunicação: Jornal do Domingo: Revista Universal (1881-1888); Ribaltas e Gambiarras (1881), A ReformaA RepúblicaO Correio Paulistano; Imprensa Acadêmica de São PauloGazeta de Notícias. Na web há farto material sobre Luiz Guimarães Junior, autor de Poesia: Corimbos (1866); Noturnos (1872); Sonetos e Rimas (1880); Ficção: Filigranas (1872); Contos sem Pretensão (1872); Curvas e Ziguezagues (1872), Caprichos Humorísticos em Prosa (1872). Romance: Lírio Branco (1862); A Família Agulha (1870); Teatro: Uma Cena Contemporânea (1862); As Quedas Fatais; André Vidal; As Joias Indiscretas; Um Pequeno Demônio; O Caminho Mais Curto; Os Amores Que Passam; Valentina; A Alma Do Outro Mundo (1913); Biografias: A. Carlos Gomes; Pedro Américo (1871). Iracema Guimarães Vilela, filha do escritor, em seu livro Luís Guimarães Júnior: Ensaio Biobibliográfico (1934), revela que o autor, pouco antes de morrer, em 1898, queimou diversos manuscritos (peças, crônicas e poemas), incluindo as duas primeiras edições de Sonetos e Rimas (1880 e 1886) suas últimas obras impressas em vida. Saber mais: Academia Brasileira de Letras; artculturalbrasil.

sábado, 24 de setembro de 2016

Olavo Bilac: A Boneca

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

Olavo Bilac (1865-1918) é um dos mais importantes escritores brasileiros. Já publiquei por aqui vários poemas seus: O Soldado e A Trombeta; Velhice; O Remédio; As Velhas Árvores; A Avó..., e até mesmo o exaltação A Pátria. Grande parte de sua obra é dedicada ao universo infantojuvenil. Do seu livro Poesias Infantis (1904), resgato dois poemas. Ontem você conheceu as dores de O Pássaro Cativo..., um pertinente libelo à liberdade. Hoje você “assiste” ao pega-pega de duas garotas pela posse de um brinquedo muito especial em A Boneca..., que também já esteve por aqui em uma postagem que reuniu também Guerra Junqueiro e um autor (inglês) desconhecido discorrendo sobre o mesmo assunto: Boneca..., onde incluí vários links para downloads legais. Amanhã o dia está reservado para a beleza desconcertante (ou expressionista) da fauna em um soneto de Luiz Guimarães Junior (1845-1898).


        

A  Boneca
Olavo Bilac

Deixando a bola e a peteca,
Com que inda há pouco brincavam,
Por causa de uma boneca,
Duas meninas brigavam.

Dizia a primeira: “É minha ! “
— “É minha!” a outra gritava;
E nenhuma se continha,
Nem a boneca largava.

Quem mais sofria (coitada!)
Era a boneca. Já tinha
Toda a roupa estraçalhada,
E amarrotada a carinha.

Tanto puxavam por ela,
Que a pobre rasgou-se ao meio,
Perdendo a estopa amarela
Que lhe formava o recheio.

E, ao fim de tanta fadiga,
Voltando a bola e a peteca,
Ambas, por causa da briga,
Ficaram sem a boneca...

*
ilustração de Joba Tridente.2012


Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac (Rio de Janeiro-RJ: 16.12.1865 - Rio de Janeiro-RJ: 28.12.1918), jornalista, escritor (parnasiano) de prosa e verso e membro fundador da Academia Brasileira de Letras (1896), onde ocupou a cadeira 15, cujo patrono é o poeta Gonçalves Dias. Olavo Bilac, eleito Príncipe dos Poetas Brasileiros, pela revista Fon-Fon, em 1907, tinha grande apreço pela literatura dirigida aos jovens. Republicano e nacionalista o polemista escritor é autor do Hino à Bandeira e de Poesias (1888); Crônicas e novelas (1894); Sagres (1898); Crônicas e Novelas (1894); Alma Inquieta (1902); Via Láctea (1888); Sarças de Fogo (1888); O Caçador de Esmeraldas (1902); As Viagens (1902); Crítica e fantasia (1904); Poesias infantis (1904); Contos Pátrios (1904); Conferências literárias (1906); Tratado de versificação (1905); Dicionário de rimas (1913); Ironia e piedade (1916); A Defesa Nacional (1917); Tarde (1919). Para saber mais: Academia Brasileira de Letras; Wikipédia.

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