quinta-feira, 7 de julho de 2011

Joba Tridente: ver de doer ver

ilustração de Joba Tridente: ver de doer ver

Quando a vi, tão acabada e desconsolada, mal a reconheci. Quando nova, e não faz tempo, era macia, maleável, absorvente. Sempre me pareceu feliz, atenciosa, disposta e diria até disponível. Oportunista nunca foi, mas sabia ser oportuna delicadamente. Para alguns ela era onipresente. Para outros, útil até em alguns sonhos ocultos. Para não dizer apenas em conversas atropeladas e palavras mal ditas e ideias equivocadas. Silenciou muita coisa destinada ao caos, procurando cultivar uma paz relativa.

Porém, sei que foi usada, abusada, mastigada, furada, pisada, quebrada por muitos. Mas conservou a serenidade, ou pelo menos uma serenidade possível. Talvez acreditasse que estivesse no mundo para isso, também. No entanto soube que aos poucos deixou-se consumir e, como se tomada por fungos assassinos ou micróbios alienígenas, está enrijecendo.

Agora a vejo ali, envelhecida prematuramente e me parece algo endereçado ao lixo. Eu a toco suavemente e sinto que aindaalgo macio, talvez um verbo novo, dentro dela. Mas é chegada a sua hora. Não lhe resta muito. Então eu a pego, acaricio, e digo adeus à minha borracha verde que nem mesmo teve a chance de amadurecer. 

Joba Tridente - 27.04.1999
Ilustração de Joba Tridente - 2011

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...