terça-feira, 23 de junho de 2020

Pippo Delbono: Dez Poemas Curtos



PIPPO DELBONO
Dez Poemas Curtos

Os poemas curtos ou haicais, abaixo, foram extraídos, por mim, da peça teatral Orchidee (2013), do dramaturgo e diretor italiano Pippo Delbono, disponibilizada gratuitamente (com legendas em português, traduzidas por David Pais e revistas por Rita Gonçalves Ramos) pelo Istituto Italiano di Cultura di Rio de Janeiro. A quebra dos versos e adaptação são minhas.

Confesso que não conhecia obra alguma do autor até assistir às provocantes e desconcertantes apresentações de suas peças Questo Buio Feroce (Esta Escuridão Feroz, 2006); Dopo la Battaglia (Após a Batalha, 2011) e Orchidee (Orquídeas, 2013) no ciclo Teatro Italiano em Streaming, do Instituto Italiano de Cultura do Rio de Janeiro, compartilhado no Vimeo (com legendas em português, italiano, espanhol, francês e polonês). A que mais me tocou foi Esta Escuridão Feroz, inspirada na obra (This Wild Darkness: The Story of My Death) do escritor americano Harold Brockey (1930-1996), morto em consequência da AIDS. Mas foi Orquídeas que, após uma tocante narrativa sobre as cerejeiras do quintal da infância do dramaturgo, me surpreendeu com os breves poemas saindo dos escuros bastidores para a luminosidade da boca de cena. Eles não são gratuitos, têm tudo a ver com as entranhas do espetáculo, mas me pegaram na rasteira do inesperado de uma peça que, na voz de Delbono: “..., nasce de um grande vazio que minha mãe me deixou quando morreu. Minha mãe, que depois dos conflitos, das separações, encontrei novamente. Eu, um pouco mais velho, um pouco mais sábio, ela um pouco mais criança. E assim o vazio. O não se sentir mais filho de ninguém. O vazio do amor. Mas Orchidee também nasce de muitos vazios, de muitos abandonos. O vazio que vivemos na cultura, em sermos artistas perdidos. O próprio teatro que sinto muitas vezes um lugar que ficou muito empoeirado, falso, morto. A mentira aceita, da representação teatral.



DEZ POEMAS CURTOS
Pippo Delbono

céu longínquo,
flutua nas minhas pupilas
a face da minha mãe.


o meu corpo definha,
o meu espírito ilumina-se.
montanhas nevadas.


se a dor tivesse uma voz,
seria o grito
dos patos selvagens.


o grito dos grous,
tão forte que parece
a minha própria voz.


montanhas no sono,
cada árvore se prepara
para ser caixão.


dormirei bem,
até que a lande dos meus sonhos
reverdeje.


no fim,
tornar-me-ei árvore
na lande nevada.


feto de inverno:
é o sonho
ou a lembrança de um sonho


aos sessenta anos,
o coração inconsolável,
eu atravesso o mar.


na minha morte,
vinde todos,
disfarçados de pássaros.


***
ilustração.joba.tridente.2020
*lande: charneca
*feto: planta

Pippo Delbono (Varazze-Itália: 1959) é dramaturgo, roteirista, escritor, ator e diretor de teatro e cinema. Nos anos 1980 estudou arte dramática em uma escola tradicional em Savona, onde conheceu o ator argentino Pepe Robledo, do Libre Teatro Libre. Os dois se mudaram para a Dinamarca, juntando-se ao grupo Farfa, dirigido por Iben Nagel Rasmussen, atriz histórica do Odin Teatret. Em busca de uma nova linguagem teatral, Delbono se dedicou ao estudo dos princípios do teatro oriental, no qual o foco é o trabalho meticuloso e rigoroso do ator sobre o corpo e a voz. Em 1987, conheceu Pina Bausch, e foi convidado para participar do Wuppertaler Tanztheater, ocasião extraordinária que marcou uma etapa fundamental na carreira artística do diretor polêmico e original. Os espetáculos de Pippo Delbono não são meras transposições cênicas de textos teatrais, mas criações totais, geralmente composta por narrativas em off, cenas mudas, performances, monólogos, diálogos, números musicais, colagem de textos de autores diversos como Bertold Brecht, Charlie Chaplin, Pier Paolo Pasolini, Bíblia. A sua companhia agrega atores profissionais e participação de pessoas marginalizadas (portadores de doenças mentais, ex-moradores de rua, portador de síndrome de Down), criando uma experiência cênica única no palco e na platéia. Entre os seus espetáculos estão: Barboni; Il Tempo degli Assassini; La Rabbia, Guerra; Esodo; Gente di Plastica; Urlo; Il Silencio; Racconti di Giugno; Questo Buio Feroce; La Menzogna; Dopo la Battaglia; Orchidee; Vangelo; La Gioia. Fonte: web e Instituto Italiano de Cultura.
Para saber mais: Compagnia Pippo Delbono: Pippo Delbono; Wikipédia: Pippo Delbono; Facebook: Pippo Delbono; Revista Lume UFRGS: entrevista Pippo Delbono; Revistas USP - Martha Ribeiro: Corpos sublimes: o teatro-festa de Pippo Delbono Il vangelo della teatralità; Capital Cultural: entrevista: Pippo Delbono.

sábado, 6 de junho de 2020

Poetas da 2ª Guerra: Bertolt Brecht, Jaroslav Seifert e Marina Tzvietáieva



POETAS da 2ª GUERRA
Bertolt Brecht Jaroslav Seifert Marina Tzvietáieva

Certo dia, vagando pela internet, à busca de informações sobre alguns autores (para compor suas biografias), dei de cara com o ebook Segunda Guerra Mundial - Uma Antologia Poética (2014), que reúne poetas contemporâneos ao conflito e conta com a organização, seleção, edição e notas do escritor Sammis Reachers. Arquivei a edição grátis (em PDF) para pesquisa e escolha de algum autor para futura postagem. Bem, creio que os 75 anos que marcam o “fim” de uma das maiores tragédias praticadas pelo homem contra o homem é o momento propício para uma sempre pertinente reflexão sobre a ganância e a estupidez humanas. Dos 49 autores publicados na antologia Segunda Guerra Mundial, selecionei 12: Carlos Drummond de Andrade (Visão 1944), Cecília Meireles (Pistóia - Cemitério Militar Brasileiro), Murilo Mendes (Tempos Duros), Tasos Leivaditis (Esta estrela é para todos nós), Gerrit Kouwenaar (Terceiro Canto Heróico), János Pilinszky (Paixão de Ravensbrück), KeithDouglas (Vergissmeinnicht), Salvatore Quasímodo (Milão, Agosto de 1943), Sadako Kurihara (Dizendo “Hiroshima”), Bertolt Brecht (Regresso), Jaroslav Seifert (Os mortos de Lídice), Marina Tzvietáieva (Tomaram...).

No prefácio de Segunda Guerra Mundial - Uma Antologia Poética, Sammis Reachers, que já organizou mais de uma dezena de antologias, principalmente religiosas, como a Antologia de Poesia Cristã em Língua Portuguesa (2008) e a Breve Antologia da Poesia Cristã Universal (2012), diz que o seu interesse pelo tema da Segunda Guerra Mundial, expressado em seu livro  Poemas da Guerra de Inverno (2012/2014), vem desde a infância, antes mesmo do seu apreço pela literatura. Na difícil seleção de obras para a antologia da Segunda Guerra, Sammis Reachers buscou “apenas poemas de autores contemporâneos ao conflito, e de países diretamente envolvidos na guerra. Sejam war poets “clássicos” (soldados-poetas que participaram em algum momento da guerra, engajados em exércitos regulares), sejam vítimas (população de países subjugados, judeus e minorias étnicas, críticos e inimigos ideológicos do regime), sejam partisans e combatentes das resistências que pululavam nas mais diversas frentes do conflito. E também o que se poderia chamar de poetas expectadores, que, embora nativos de países envolvidos na guerra, apenas a acompanharam pelos canais noticiosos, caso de alguns poetas dos EUA e de outros países americanos, como o chileno Pablo Neruda e brasileiros como Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes e outros.”

Nota: Como alguns poemas são longos, farei cinco postagens, reunindo dois e ou três autores em cada uma. As ilustrações (2020) são de Joba Tridente.


                         
Regresso
Bertolt Brecht
Tradução: Paulo César de Souza

A cidade natal, como a encontrarei ainda?
Seguindo os enxames de bombardeiros
Volto para casa.
Mas onde está ela? Lá onde sobem
Imensos montes de fumaça.
Aquilo no meio do fogo
É ela.

A cidade natal, como me receberá?
À minha frente vão os bombardeiros. Enxames mortais
Vos anunciam meu regresso. Incêndios
Precedem o filho.




      
Os mortos de Lídice
Jaroslav Seifert
tradução: ?

A andorinha não encontrou seu teto,
Solta gritos de queixa, erra
Só há árvores negras, cá como lá
Cetros quebrados jorram da terra
E vocês, com o calcanhar na terra para o passo final,
Quando o caminho deságua na beira do precipício,
Vocês entram na sombra de braços abertos,
Como semeadores diante de sulcos vazios.
Ao menos a cotovia retorna para vê-los
Mais perto de vocês ela ouve melhor
O que somente os pássaros compreendem bem
Tu ouvirás talvez, em sua mensagem,
Cantar a terra que sacia o fundo
As bocas ainda cerradas de ira
Cantar a lápide deitada perto da trincheira
E os silêncios que sobre os seus nomes tombaram
Cantar a angústia dos tempos de raptos
Cantar o choro de lábios que brilham
Quando se desejava ser demente
Mas faltava tempo para a loucura
Cantar o terror ancorado no fundo do olhar
Quando vossas mulheres se colaram às portas
Como o náufrago se agarra a haste incerta
Já sem rumo para sua esperança morta
Cantar o instante de calmaria sublime
Quando resta um único suspiro
Cantar o esplendor de um povo glorioso
Sobre cujas tumbas vossos passos vão ecoar
Como outrora, lá ergue-se o cântico
Da cotovia, ó calma eternidade

As rosas, as melancólicas rosas,
Mesmo elas foram pisoteadas
                                               



                          
Tomaram...
Marina Tzvietáieva
Tradução de Augusto de Campos

"Os tchecos se acercavam dos alemães e cuspiam."
(Cf. jornais de março de 1939)

Tomaram logo e com espaço:
Tomaram fontes e montanhas,
Tomaram o carvão e o aço,
Nosso cristal, nossas entranhas.

Tomaram trevos e campinas,
Tomaram o Norte e o Oeste,
Tomaram mel, tomaram minas,
Tomaram o Sul e o Leste.

Tomaram a Vary e a Tatry,
Tomaram o perto e o distante,
Tomaram mais que o horizonte:
A luta pela terra pátria.

Tomaram balas e espingardas,
Tomaram cal e gente viva.
Porém enquanto houver saliva
Todo o país está em armas.

N.T.: 9 de maio de 1939 (um dos muitos poemas feitos por Marina Tzvietáieva em protesto contra a invasão da Tchecoslováquia pelos nazistas)


Bertolt Brecht (Augsburg/Alemanha: 10.02.1898 - Berlim Leste/Alemanha: 14.08.1956): escritor de prosa e verso, dramaturgo criador do teatro épico, cuja proposta era discutir as relações sociais. Brecht, que publicou seu primeiro texto aos 16 anos, interrompeu o curso de Medicina, em Munique, para servir, como enfermeiro, durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Com a ascensão do nazismo, exilou-se em vários países (Áustria, Dinamarca, Finlândia, Inglaterra, Estados Unidos) até se estabelecer, em 1947, em Berlim Oriental, onde fundou a célebre companhia de teatro “Berliner Ensemble”. Dono de uma linguagem literária afiadíssima e de uma dramaturgia arrebatadora e ainda pertinente e influenciadora do teatro do contemporâneo, Bertold Brecht, que recebeu o Prêmio Lenin da Paz (1954), nos deixou uma belíssima bibliografia, onde se destacam principalmente suas peças de teatro, que pode ser conferida aqui:
Para saber mais: Templo Cultural Delfos: Bertolt Brecht - poemas e Bertolt Brecht - poemas II; Cultura Brasil: Bertolt Brecht - Uma Breve Biografia; Vermelho: O revolucionário Bertolt Brecht; DW: Brecht (vários artigos); Vasco Soares de Oliveira Cunha: Bertolt Brecht - Vida e Obra; Scielo: Mark W. Clark: Herói ou vilão? Bertolt Brecht e a crise de junho de 1953; Comunidade Cultura e Arte: As peças e causas do teatro de Bertolt Brecht; Suplemento Pernambuco: André Vallias traduz Bertolt Brecht; piauí-folha-quadrinhos: Edward Sorel: Vidas Literárias: Bertolt Brecht; Esquerda Diário: Bertold Brecht: resenha, legado e polêmica; Fragmentos UFSC - Marli Terezinha Furtado: Bertolt Brecht e o teatro épico; Diário do Nordeste - Iracema Sales: Bertolt Brecht: um poeta de posição revolucionária; BDTD - Márcio Fransen Pereira: Bertolt Brecht: utopia e imagem: uma narrativa do exílio; Repositório Unesp: Natália Kneipp Ribeiro Gonçalves: As peças didáticas de Bertolt Brecht e o processo de alfabetização; Garrafa 23 - UFRJ - Lucimar Ribeiro Soares: Memórias da Guerra em poemas de Bertolt Brecht; NUMIN: Bertold Brecht; BBC: Epic theatre and Brecht; Galiza Livre: Bertolt Brecht: O fascismo é a verdadeira face do capitalismo; SciELO - Bertolt Brecht: O rádio como aparato de comunicação; Le Monde Diplomatique - Marie-Noël Rio: Reencontrar o riso de Bertolt Brecht; IEA-USP - Leandro Konder: A Poesia de Brecht e a História.

Paulo César de Souza (Salvador/Bahia: 1955): Licenciado em história pela Universidade Federal da Bahia, doutorou-se em literatura alemã na USP. É editor e tradutor, tendo recebido dois prêmios Jabuti, pela tradução das obras de Nietzsche e de Brecht. Coordena a coleção do filósofo alemão publicada pela Companhia das Letras desde 1992. Para saber mais: Folha de S.Paulo: Paulo César de Souza; SciELO - Betty Bernardo Fuks: Comentário sobre a tradução de Paulo César Souza das obras completas de Sigmund Freud; Goethe: Traduções de Paulo César de Souza; Youtube: Traduzir Freud – Paulo César de Souza.

Jaroslav Seifert (Praga/Tchéquia: 23.09.1901 - Praga/Tchéquia: 10.01.1986): escritor de prosa e verso, jornalista e tradutor de Guillaume Apollinaire e Paul Verlaine. Jaroslav Seifert que, na década de 1920, foi editor dos jornais comunistas RovnostSršatec e Reflektor e membro do Partido Comunista, publicou seus primeiros poemas em 1921. Nos anos 1930 e 1940, em protesto à influência stalinistas bolcheviques da nova liderança, deixou o Partido e edita os jornais Pestré kvety e Ranní noviny, da imprensa social-democrata, e também os diários Národní práce e Práce, bem como o mensal literário Kytice (1945 a 1948). Forçado a deixar o jornalismo em 1949, Seifert, ganhador do Nobel de Literatura (1984) e fundador da revista literária vanguardista Devětsil (1922), cuja "poesia proletária" foi ganhando lirismo no decorrer da vida, recorrendo às lembranças da infância no campo, passa a se dedicar exclusivamente à literatura, publicando também obras para o público infantil e recorrendo a editoras estrangeiras para burlar a censura do seu país. Conheça a sua bibliografia aqui.
“O poema Os Mortos de Lídice faz referência ao Massacre de Lídice, quando toda a vila tcheca foi exterminada, como vingança pelo assassinato do sanguinário Reinhard Heydrich, segundo em comando das SS, morto por membros da resistência checa. Os homens da vila foram fuzilados e mulheres e crianças enviadas para campos de concentração. A cidade foi dinamitada e depois aplanada com tratores, para cumprir o desígnio de Hitler de “varrê-la do mapa”.” Sammis Reachers.
Para saber mais: Wikipédia: Jaroslav Seifert e ou Jaroslav Seifert; Infopédia: Jaroslav Seifert; modo de usar: Jaroslav Seifert; Find A Grave: Jaroslav Seifert; El País: Jaroslav Seifert; My poetc Side: Jaroslav Seifert; Biografías y Vidas: Jaroslav Seifert; Poet’anarquista: Poesia - Jaroslav Seifert; Zenda: 5 poemas de Jaroslav Seifert; le pays nest pas la carte: Um guarda-chuva de piccadily – Jaroslav Seifert; A Media Voz: Poemas de Jaroslav Seifert; Fausto Marcelo: Poemas de Jaroslav Seifert; Poetas Siglo XXI: Jaroslav Seifert; Escritores Que Nadie Lee: Jaroslav Seifert; La Outra: La estación central. Jaroslav Seifert; Tiro de Letra: Grandes Entrevistas - Jaroslav Sefert; Crear em Salamanca: Praga y Jaroslav Seifert. Ensayo de Enrique Viloria Vera; Aires de Libertad: Jaroslav Seifert; Ersilias: Jaroslav Seifert, poeta, Praga, 1901-1986;

Marina Ivánovna Tsvietáieva (Moscou/Rússia: 26.09.1892 - Ielabuga/Rússia: 31.08.1841): escritora de prosa e verso, dramaturga e tradutora viveu uma vida digna de uma ópera russa: requinte e miséria; exílios, mortes e prisões; família destroçada; “suicídio”. Participou ativamente da vida cultural européia, principalmente a checa e a francesa. A versão mais aceita é a de que a perseguição do regime autoritário soviético (responsável por dizimar quase toda a sua família) a teriam levado ao “suicídio”. A sua obra poética, salva da destruição e do esquecimento por filha Ariadna Efron, só foi publicada após a Segunda Guerra Mundial. Confira a sua bibliografia aqui.

Augusto de Campos (São Paulo/Brasil: 14.02.1931): poeta, tradutor, ensaísta, crítico de literatura e música. Em 1951, publicou o seu primeiro livro de poemas, O REI MENOS O REINO. Em 1952, com seu irmão Haroldo de Campos e Décio Pignatari, lançou a revista literária "Noigandres", origem do Grupo Noigandres que iniciou o movimento internacional da Poesia Concreta no Brasil. O segundo número da revista (1955) continha sua série de poemas em cores POETAMENOS, escritos em 1953, considerados os primeiros exemplos consistentes de poesia concreta no Brasil. O verso e a sintaxe convencional eram abandonados e as palavras rearranjadas em estruturas gráfico-espaciais, algumas vezes impressas em até seis cores diferentes, sob inspiração da Klangbarbenmelodie (melodia de timbres) de Webern. Em 1956 participou da organização da Primeira Exposição Nacional de Arte Concreta (Artes Plásticas e Poesia), no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Sua obra veio a ser incluída, posteriormente, em muitas mostras, bem como em antologias internacionais como as históricas publicações Concrete Poetry: an International Anthology, organizada por Stephen Bann (London, 1967), Concrete Poetry: a World View, por Mary Ellen Solt (University of Bloomington, Indiana, 1968), Anthology of Concrete Poetry, por Emmet Williams (NY, 1968). A maioria dos seus poemas acha-se reunida em VIVA VAIA, 1979, DESPOESIA (1994) e NÃO (com um CDR de seus Clip-Poemas), (2003). Outras obras importantes são POEMÓBILES (1974 e CAIXA PRETA (1975), coleções de poemas-objetos em colaboração com o artista plástico e designer Julio Plaza. Fonte: Site Oficial: Augusto de Campos.
Para saber mais: Templo Cultural Delfos: Augusto de Campos - antropofagia e intraduções poéticas; Rascunho - Wilberth Salgueiro: Caça, de Augusto de Campos; Antonio Miranda: Augusto de Campos; Vermelho: Claudio Daniel: A multipoesia de Augusto de Campos; Abralic - Cristina Monteiro de Castro Pereira: Entrevista com Augusto de Campos; Youtube: Poesia além da página com Augusto de Campos.

Sammis Reachers (Niterói-RJ: 09.05.1978): poeta, antologista, editor e blogueiro, promotor e divulgador da poesia cristã/evangélica através das antologias que organiza e dos blogs como o Poesia Evangélica, onde já publicou mais de trezentos autores. É autor (em formato e-book ou impresso) dos livros de poesia: Uma Abertura na Noite (2006); A Blindagem Azul (2007); Granadas - Contém: Armas Pesadas (2012); Poemas da Guerra de Inverno (2012); Deus Amanhecer (2013); Poemas da Guerra de Inverno - edição revista e ampliada (2014); PULSÁTIL - Poemas canhestros & prosas ambidestras (2014); e de contos: O Pequeno Livro dos Mortos. À exceção da segunda edição de Poemas da Guerra de Inverno e do livro de contos, seus livros e antologias podem ser lidos online ou baixados gratuitamente aqui. Sammis Reachers administra os seguintes blogs:  O Poema Sem Fim (pessoal): http://opoemasemfim.blogspot.com; Liricoletivo: http://liricoletivo.blogspot.com; Mar Ocidental: http://marocidental.blogspot.com. Poesia Evangélica: http://poesiaevanglica.blogspot.com;

sexta-feira, 5 de junho de 2020

Poetas da 2ª Guerra: Salvatore Quasímodo e Sadako Kurihara



POETAS da 2ª GUERRA
Salvatore Quasímodo Sadako Kurihara

Certo dia, vagando pela internet, à busca de informações sobre alguns autores (para compor suas biografias), dei de cara com o ebook Segunda Guerra Mundial - Uma Antologia Poética (2014), que reúne poetas contemporâneos ao conflito e conta com a organização, seleção, edição e notas do escritor Sammis Reachers. Arquivei a edição grátis (em PDF) para pesquisa e escolha de algum autor para futura postagem. Bem, creio que os 75 anos que marcam o “fim” de uma das maiores tragédias praticadas pelo homem contra o homem é o momento propício para uma sempre pertinente reflexão sobre a ganância e a estupidez humanas. Dos 49 autores publicados na antologia Segunda Guerra Mundial, selecionei 12: Carlos Drummond de Andrade (Visão 1944), Cecília Meireles (Pistóia - Cemitério Militar Brasileiro), Murilo Mendes (Tempos Duros), Tasos Leivaditis (Esta estrela é para todos nós), Gerrit Kouwenaar (Terceiro Canto Heróico), János Pilinszky (Paixão de Ravensbrück), KeithDouglas (Vergissmeinnicht), Salvatore Quasímodo (Milão, Agosto de 1943), Sadako Kurihara (Dizendo “Hiroshima”), BertoltBrecht (Regresso), Jaroslav Seifert (Os mortos de Lídice), Marina Tzvietáieva (Tomaram...).

No prefácio de Segunda Guerra Mundial - Uma Antologia Poética, Sammis Reachers, que já organizou mais de uma dezena de antologias, principalmente religiosas, como a Antologia de Poesia Cristã em Língua Portuguesa (2008) e a Breve Antologia da Poesia Cristã Universal (2012), diz que o seu interesse pelo tema da Segunda Guerra Mundial, expressado em seu livro  Poemas da Guerra de Inverno (2012/2014), vem desde a infância, antes mesmo do seu apreço pela literatura. Na difícil seleção de obras para a antologia da Segunda Guerra, Sammis Reachers buscou “apenas poemas de autores contemporâneos ao conflito, e de países diretamente envolvidos na guerra. Sejam war poets “clássicos” (soldados-poetas que participaram em algum momento da guerra, engajados em exércitos regulares), sejam vítimas (população de países subjugados, judeus e minorias étnicas, críticos e inimigos ideológicos do regime), sejam partisans e combatentes das resistências que pululavam nas mais diversas frentes do conflito. E também o que se poderia chamar de poetas expectadores, que, embora nativos de países envolvidos na guerra, apenas a acompanharam pelos canais noticiosos, caso de alguns poetas dos EUA e de outros países americanos, como o chileno Pablo Neruda e brasileiros como Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes e outros.”

Nota: Como alguns poemas são longos, farei cinco postagens, reunindo dois e ou três autores em cada uma. As ilustrações (2020) são de Joba Tridente.



                           

Milão, Agosto de 1943
Salvatore Quasímodo
Tradução: Sílvio Castro

Em vão perscrutas o pó,
pobre mão, a cidade é morta.
É morta: ouviu-se o último rombo
no coração do Naviglio. E o rouxinol
despencou da antena, alta no convento,
onde cantava antes do pôr-do-sol.
Não escaveis poços nos pátios:
os vivos não têm mais sede.
Não toqueis os mortos, tão vermelhos, tão inchados,
deixai-os no chão de suas casas:
a cidade é morta, é morta.



      
Dizendo “Hiroshima”
Sadako Kurihara
tradução?

Poderia ao dizer-se “Hiroshima”
jamais elucidar com paixão
“Oh, Hiroshima”?
Dizer “Hiroshima” levanta respostas a “Pearl Harbor”,
“O massacre de Nanjing”,
“Brutais execuções em Manila,
mulheres, crianças,
amontoadas como animais em trincheiras,
encharcadas com gasolina,
e queimadas vivas.”

Reações à quando se diz “Hiroshima”
reverberam com fogo e sangue.

Diz-se “Hiroshima”
e ninguém se simpatiza.
Ao invés, a fúria dos asiáticos, agora sem voz,
mortos e violados, aparece.

Se temos o desejo de sentir compaixão quando se diz “Hiroshima”
Temos que de fato baixar nossas armas.
Temos que remover as bases militares estrangeiras.
Mas até que esse dia venha,
Hiroshima evocará a amargura da crueldade e desconfiança,
e nós seremos como marginalizados de uma sociedade,
queimando em energia atômica.

Para nós, japoneses,
Ouvirmos um apaixonado
“Oh, Hiroshima”,
É necessário, primeiro,
Purificar nossas mãos sujas.



Salvatore Quasimodo (Módica/Itália: 20.08.1901 - Amalfi/Itália: 14.06.1968): matemático, engenheiro, escritor, crítico literário, professor de literatura e tradutor de Sófocles, Eurípedes, Catulo, Ovídio, Virgílio, Shakespeare, Molière, Pablo Neruda, E.E. Cummings. Quasímodo, que integrou o movimento antifascista durante a Segunda Guerra, publicou seus poemas na revista de vanguarda Solaria (1929) e na revista do movimento hermético Letteratura (1938). Laureado com o Nobel de Literatura (1959), Salvatore Quasimodo,  que tornou-se mestre honoris causa da Universidade de Messina (1960) e da Universidade de Oxford (1967), na sua jornada literária recebeu também os prêmios dell'Antico Fattore (1932), San Babila (1950), Etna-Taormina (1953) e Vieareggio (1958). Foram traduzidos para o português os seguintes livros: poesias escolhidas (1968 e 1973) e Salvatore Quasimodo - poesias (1999). Confira a sua bibliografia aqui.
Para saber mais: Templo Cultural Delfos: Salvatore Quasimodo - poeta siciliano; Biografia: Salvatore Quasimodo; Nobel Prize: Salvatore Quasimodo; Escamandro: salvatore quasimodo, por ernesto von artixzffski; Poets of modernity: Salvatore Quasimodo - Selected Poems; Ian Garcez: Salvatore Quasimodo; Biografías y Vidas: Salvatore Quasimodo.

Sílvio Castro (Laranjais-RJ/Brasil: 1931 - Veneza/Itália: 2014): escritor de prosa e verso, tradutor, crítico literário, ensaísta, professor de Língua e Literatura Portuguesa e de Literatura Brasileira na Universidade de Pádua. Entre suas obras se destacam: Infinito Sul (1956); As Noites (1958); Machado de Assis e a Cidade do Rio de Janeiro (1959); Tempo Presente (1961); Rachel de Queiroz e o Romance Nordestino (1961); Raiz Antiga (1965); Tempo Veneziano (1967); Campo Geral: Estrutura e Estilo de Guimarães Rosa (1970); A Revolução da Palavra: Origens e Estrutura da Literatura (1976); Teoria e Política do Modernismo Brasileiro (1979); A Carta de Pero Vaz de Caminha (1987): O percurso sentimental de Cesário Verde (1990); Viver em Malabase (1993); Memorial do Paraíso - o Romance do Descobrimento do Brasil (1998); História da Literatura Brasileira (2000); Poesia do Socialismo Português no Percurso de 1850 a 1974 (2010).
Para saber mais: Antonio Miranda: Silvio Castro; A Viagem dos Argonautas: Silvio Castro; Scortecci: Silvio Castro - Poesia do Social e do Socialismo Brasileiro.
  
Sadako Kurihara (Hiroshima/Japão: 04.03.1913 - 06.03.2005): escritora e ensaísta sobrevivente do bombardeio atômico em Hiroshima cuja obra poética aborda de forma corajosa e impressionante realismo questões de energia nuclear, sociopolíticas japonesa e principalmente a situação invasiva do Japão durante Segunda Guerra Mundial, que culminou com o vil ataque à Hiroshima e Nagasaki. Kurihara, que já escrevia tankas/haikais desde a juventude, começou a escrever profissionalmente após a explosão da bomba atômica em Hiroshima (a quatro quilômetros de sua casa). Um dos seus poemas mais famosos relata o nascimento de uma criança, em um abrigo sob os Correios, durante o bombardeio em Hiroshima. Ativista ferrenha contra as guerras e o genocídio, fundou em 1969 o "Gensuikin Hiroshima Haha no Kai" (Grupo de Mães de Hiroshima contra Bombas A e H), organizou diversas antologias, editou jornais e revistas e participou de inúmeros simpósios literários locais e internacionais contra armamentismo nuclear, a pobreza, a opressão, o desrespeito aos direitos humanos. Sadako Kurihara, que recebeu o Prêmio da Paz Kiyoshi Tanimoto, tem uma extensa bibliografia com traduções para o inglês.

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