segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Joba Tridente: Vento

  
Vento
de um tempo em que escrever
era muito mais que experimentar

                                                       corre.......................
                                                       a menina ao vento
                                                       corre.......................
                                                       na menina o vento
                                                       corre.......................

Poesia: Joba Tridente – 1975
Ilustração: Joba Tridente - 2010

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Livro: Frederico Godofredo


Frederico Godofredo
e O Pequeno Colecionador

No mês de Setembro de 2010, quando participava da Semana Literária do SESC Paraná (Pato Branco, Toledo, Jacarezinho), apresentando o espetáculo 3 ou 4 Histórias Que Vou Te Contar, e também orientando Oficinas de Objetos e Bonecos na Contação de Histórias, conheci a escritora Liana Leão (professora de Literaturas de Língua Inglesa na UFPR) que vem se dedicando à Literatura Infantojuvenil, desde 2004. Conversa vai e conversa vem, ao saber que eu trabalhava tão somente com material reciclável, ela me presenteou com os livros: Frederico Godofredo (Editora Elementar, 2010) e O Pequeno Colecionador (Franco Editora, 2010). Fiquei agradecido e encantado, principalmente pelo primeiro deles.

Frederico Godofredo é um livro lindo, não apenas pela singeleza do texto de Liana Leão, mas pelo excelente projeto gráfico que destaca a maestria da ilustradora Márcia Széliga, que, através de desenhos (apurados no uso preciso de lápis de cor) e de colagens (reciclando diversos materiais), nos presenteia com imagens belíssimas, ricas em detalhes e sedução.


(...) “As coisas usadas, que para as outras crianças não tinham serventia, para ele eram matéria-prima de invenção: fazia jangadas com palitos de sorvete e, com panos velhos, fazia as velas. Depois enchia uma bacia e soprava forte. Seu sopro virava vento.

Frederico Godofredo é um menino que adora dar asas à imaginação. Ele está sempre (re)aproveitando, em suas mágicas criações, o que lhe cai nas mãos ou que encontra pelo caminho. A sua inventividade não tem limites e, com graça e beleza, o que parece inútil vira novo (de novo): brinquedos velhos e quebrados, objetos estranhos e até mesmo papeis usados. Para Frederico, tudo tem (re)utilidade, num mundo de constante aprendizado (e mudanças). Liana trabalha, de maneira lúdica e convincente, a questão da reciclagem. A sua narrativa, poética e inteligente, não subestima a capacidade inventiva das crianças e, sabiamente, não encerra nenhuma lição de moral (piegas). Todavia, em suas entrelinhas, há um sutil ensinamento vital sobre a importância de cada coisa ao nosso redor. O texto é gostoso, fluido e acessível pra qualquer idade. A autora mostra como é possível falar de felicidade, filosofar com as crianças, sem ser chata e, muito menos, didática.

O Pequeno Colecionador conta a história de um rei que teve sempre tudo o que quis. Um dia ele decidiu promover um concurso de coleções, no seu reino, onde o povo colecionava de tudo, até mesmo o que não se acreditava ser possível colecionar: sonhos. E ali, entre crianças e adultos, com todas as suas bugigangas, o rei descobriu muito sobre si mesmo e o porquê de nunca ter sido plenamente feliz. É uma bonita narrativa que tem alguma similaridade com Frederico Godofredo. Ambas (de certa forma) tratam do consumismo desenfreado que vitima principalmente as crianças. É como se (Frederico) fosse uma história (autônoma) mais enxuta de um dos colecionadores. Enquanto O Pequeno Colecionador é textual, Frederico Godofredo é visual. Um privilegia o texto extenso e o outro, a imagem ampla. As duas histórias falam da importância de uma infância bem vivida e de como o aprendizado (para toda uma vida) pode ser divertido e inesquecível.

É importante destacar que a função básica de um ilustrador (e do programador visual) é complementar um texto sem influir na imaginação do leitor. Caso a protagonista da obra seja a ilustração, então é só inverter o formato. Digo isso porque os projetos gráficos das duas obras são bem distintos. Em O Pequeno Colecionador (infelizmente) não se encontra (nem de longe) a mesma preocupação e beleza visual de Frederico Godofredo. As ilustrações de Semíramis Paterno são acanhadas e a diagramação é primária. O que pode afastar os alfabetizandos, mas servir aos alunos maiores, que (aparentemente) não se preocupam muito com a programação visual e ou qualidade das ilustrações. Se bem que, quando o texto ajuda, nada impede um e outro leitor de se aventurar por um mundo de infinitas possibilidades de leituras em páginas repletas de textos ou de imagens.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Joba Tridente: Voto e (in)Consciência


Voto e (in)Consciência

Na TV, apresentadores de um jornal, indignados com a censura às pesquisas de intenção de votos dos eleitores: E agora, como é que vai ser. Estamos tão próximos da eleição. Muitos eleitores contam com isso. Geralmente votam em quem está ganhando. É um absurdo!

Como assim? Acho que deveria ser totalmente abolida (e definitivamente proibida) toda e qualquer pesquisa de opinião sobre intenção de voto. Aliás, o voto (MESMO SENDO OBRIGADO) não é secreto? Então!

Infeliz do país e do eleitor que depende de uma pesquisa que induza o voto (OBRIGADO). Infeliz daquele que vota (MESMO SENDO OBRIGADO) em um candidato, não porque lhe pareça bom, mas porque está à frente das pesquisas de opinião. Como se a unanimidade tivesse alguma razão. Muita gente pode estar à frente, não por ser (realmente) popular (pela honestidade do seu trabalho), mas por ser populista (pela desonestidade do seu paternalismo). Há quem não saiba (e nem quer saber) o que é ser POPULAR e o que é ser POPULISTA. Assim como não se importa em saber o que difere a DEMOCRACIA da DEMAGOGIA.

Um eleitor deve votar (MESMO SENDO OBRIGADO) em quem conhece e acredita e não em quem ouviu falar. Bandido é o que não falta na “profissão” da impunidade e da intocabilidade. Se nem um merece o seu sacrifício (OBRIGATÓRIO) de deslocamento para o cumprimento de tal gesto (OBRIGATÓRIO), que vote (MESMO SENDO OBRIGADO) em ninguém, que anule o seu voto (MESMO SENDO OBRIGADO)..., para NÃO SE ANULAR. Ou, pior, se arrepender depois.

Não existe um candidato “menos pior” que outro. Um sujeito POLÍTICO PRESTA OU NÃO. O político “menos pior” só é “menos”, porque ainda não teve a oportunidade de se tornar “mais pior” ou “totalmente pior” igual (e que nem) aos seus companheiros de falcatruas ou de partido.

O VOTO DEVERIA SER UM DIREITO E NÃO UMA OBRIGAÇÃO.

Não se deixe enganar com as conversas moles dizendo que, VOTANDO, você (CIDADÃO) está exercendo os seus DIREITOS DEMOCRÁTICOS etc etc etc. Porque você (CIDADÃO) está sendo COAGIDO a exercer o “seu” direito (democrático) ao voto. Caso contrário (se não OBEDECER tal OBRIGATORIEDADE) será PUNIDO SEVERAMENTE e EXEMPLARMENTE MULTADO - POR NÃO CUMPRIR A OBRIGATORIEDADE DO VOTO DEMOCRÁTICO, que deveria ser um mero direito de todo e qualquer cidadão livre.

No Brasil, infelizmente, ainda, NÃO É A SUA “LIBERDADE” DE ESCOLHER UM CANDIDATO QUE IMPORTA E, SIM, VOTAR.

DEMOCRACIA não se faz com AMARRAS, se faz com LIBERDADE.

Ilustração: Joba Tridente

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

65 anos de Hiroshima

Ilustração de Joba Tridente: Hiroshima 65 Anos


65 anos de Hiroshima
Há 65 anos Hiroshima recebia o atômico beijo americano da morte.


EUA. 06.08.1945. B-29 - Enola Gay.
08H00: 60 kg de urânio-235.
08H15: 80.000 mortos. Japão.


Sou de uma geração que teve o privilégio de ver o começo e a infelicidade de ver o fim do Secos & Molhados (Ney Matogrosso, Gerson Conrad e João Ricardo). No primeiro LP do grupo (1973), está a pérola Rosa de Hiroshima, poema de Vinícius de Moraes e melodia de Gerson Conrad.


Rosa de Hiroshima (Vinícius de Moraes)

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada

Ilustração de Joba Tridente - 2010

domingo, 1 de agosto de 2010

Joba Tridente: Sobreviver

Ilustração de Joba Tridente: SobreViver - 2010 - Falas ao Acaso


SOBREVIVER


Fragmento do livro METAcidaDES
unindo poe(ma)sias de um tempo
em que as palavras fluíam pequenas
ou buscavam novas formas visuais



S O B R E V I V E R

V I V E R

s u b v i v e r



*

S O B R E v i v e r

v i v e r


s u b V I V E R



Joba Tridente: 03.09.1975
Ilustração de Joba Tridente - 2010

domingo, 27 de junho de 2010

Joba Tridente: DEUS

Ilustração: Deus - Joba Tridente - Falas ao Acaso


poema do livro METAcidaDES


D E U S

Deus É um pensamento 

Pensamos como O queremos 

Pensamos quando O queremos 

Pensamos onde O queremos 

Pensamos porque O queremos 

Pensamos se O queremos 


Joba Tridente: 30.09.1986
Ilustração - 2010

terça-feira, 22 de junho de 2010

Autor: José Saramago

Saramago na animação A Flor Máis Grande do Mundo

JOSÉ SARAMAGO (1922-2010)

E se as histórias para crianças fossem leitura obrigatória para os adultos?
Seríamos realmente capazes de aprender aquilo que há tempo ensinamos?
José Saramago em A Maior Flor do Mundo



Pensar, pensar

Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de refexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, nao vamos a parte nenhuma.


(Revista do Expresso, Portugal (entrevista), 11 de Outubro de 2008)


Foto: (?)

José se foi. E agora, José? Livre pensamento ecoa. SarAMADO aqui. SarAMARGO acolá. SaraMAGO das palavras de afrontar poderosos de pés de barro. Que um dia também passarão, sem jamais ter sabido o que é ser passarinho.

Conheci o iluminado José Saramago, em 2000, quando esteve em Curitiba para divulgar o livro Caverna e para um bate-papo num auditório lotado. Eu estava acompanhado do cineasta Marcos Stankievicz Saboia, amigo, parceiro de direção no curta-metragem Cortejo e personagem do meu livro: Fragmentos da História Antropofágica e Estapafúrdia de um Índio Polaco da Tribo dos Stankienambás. É claro que não poderíamos deixar passar a ocasião de cumprimentar o genial escritor e aproveitamos um rápido intervalo, entre autógrafos, para lhe oferecer um exemplar da fictícia biografia. Saramago, muito gentil, ficou feliz com o presente e encantado em conhecer um personagem (vivo) de um livro de ficção, que também queria o seu autógrafo em diversos livros de ficção. Foi um encontro rápido, troca de elogios e apertos de mãos. Mas, inesquecível!

Para quem quiser conhecer um pouco mais a obra do fascinante escritor José Saramago, sugiro o site do autor, mantido pela sua Fundação: Outros Cadernos de Saramago

Foto sem crédito encontrada no site: http://bertachulvi.wordpress.com/2008/10/

terça-feira, 1 de junho de 2010

Joba Tridente: Wilson Bueno, não mais!



Wilson Bueno
não mais


Em 1990 eu morava em Brasília. Trabalhava no Conselho Nacional de Direito Autoral – CNDA. Então, Collor, entrou e acabou com tudo. Cansado de Brasília decidi voltar ao sul e vim parar em Curitiba. Reencontrei o grande artista plástico Rogério Dias, aquele que pinta pássaros, que insistiu pra eu conhecer o Wilson Bueno, editor do Jornal NICOLAU (1987-1995). Wilson me perguntou se gostaria de fazer o projeto gráfico do próximo número, já que seu artista gráfico, o Bond, estava saindo. Aceitei, pois já admirava o jornal. Fiquei cinco anos como Editor Gráfico (1990-1995) do NICOLAU. Então mudou o governo. Quem chegou não era grande admirador do Jornal que pensava o mundo, preferia um que pensasse o município e não tivesse tanto espaço em branco. Quem veio com o novo Governo do Paraná acabou com aquele NICOLAU premiado e inventou um Nicolau oficial que, felizmente, poucos sabem que existiu.

A equipe do NICOLAU (Bueno, Karl, Ângelo, Joba) se desfez. Cada um seguiu o seu caminho. Eu virei Oficineiro Cultural. Wilson Bueno, idealizador do NICOLAU, sempre em defesa da melhor reflexão (literária ou gráfica) universal do Jornal, que gratuitamente chegava a diversos países da Europa, da Ásia, do Oriente, das Américas..., voltou a se dedicar cada vez mais à sua literatura. Publicou, foi elogiado, indicado ao Jabuti. Wilson Bueno colhia louros reais..., até o último domingo 30 de Maio de 2010.

Agora, nem mais Tankas ou Hai-Kais. No sobrado, um silêncio de Pardais. Outono.

Foto: Daniel Snege

domingo, 30 de maio de 2010

No Brasil, Futebol é Religião



No Brasil,  Futebol é Religião

Eu participo do Grupo Cultura Infância e, nesta semana, foi postada uma mensagem de arrepiar até mesmo um Livre Pensador. O texto (abaixo) foi enviado por Sonia Regina Barbosa e prova que um Pastor, sem qualquer tipo de formação cultural é nada. Que este belo e reflexivo texto do Ed René Kivitz, da Igreja Batista de Água Branca (São Paulo) possa chegar, por qualquer via, aos pastores que vociferam pelas TVs, rádios e ruas e os ilumine.


ISTO SE CHAMA LUCIDEZ!!!‏

No dia 1°/Abr/2010, o elenco do Santos atual campeão paulista de futebol foi a uma instituição que abriga trinta e quatro pessoas. O objetivo era distribuir Ovos de Páscoa para crianças e adolescentes, a maioria com paralisia cerebral.

Ocorreu que boa parte dos atletas não saiu do ônibus que os levou. Entre estes, Robinho (26a), Neymar (18a), Ganso (21a), Fábio Costa (32a), Durval (29a), Léo (24a), Marquinhos (28a) e André (19a), todos ídolos super aguardados.

O motivo teria sido religioso: a instituição era o Lar Espírita Mensageiros da Luz, de Santos-SP, cujo lema é Assistência à Paralisia Cerebral.

Visivelmente constrangido, o técnico Dorival Jr. tentou convencer o grupo a participar da ação de caridade. Posteriormente, o Santos informou que os jogadores não entraram no local simplesmente porque não quiseram.

Dentro da instituição, os outros jogadores participaram da doação dos 600 ovos, entre eles, Felipe (22a), Edu Dracena (29a), Arouca (23a), Pará (24a) e Wesley (22a), que conversaram e brincaram com as crianças.

Eis que o escritor, conferencista e Pastor (com P maiúsculo) Ed René Kivitz, da Igreja Batista de Água Branca (São Paulo), fez uma análise profunda sobre o ocorrido e escreveu o texto "No Brasil, futebol é religião", que está transcrito a seguir.


Ilustração de Joba Tridente: Bola Murcha - 2010


No Brasil, Futebol é Religião

por Ed René Kivitz

Os meninos da Vila pisaram na bola. Mas prefiro sair em sua defesa. Eles não erraram sozinhos. Fizeram a cabeça deles. O mundo religioso é mestre em fazer a cabeça dos outros. Por isso, cada vez mais me convenço que o Cristianismo implica a superação da religião, e cada vez mais me dedico a pensar nas categorias da espiritualidade, em detrimento das categorias da religião.

A religião está baseada nos ritos, dogmas e credos, tabus e códigos morais de cada tradição de fé. A espiritualidade está fundamentada nos conteúdos universais de todas e cada uma das tradições de fé.

Quando você começa a discutir quem vai para céu e quem vai para o inferno; ou se Deus é a favor ou contra à prática do homossexualismo; ou mesmo se você tem que subir uma escada de joelhos ou dar o dízimo na igreja para alcançar o favor de Deus, você está discutindo religião. Quando você começa a discutir se o correto é a reencarnação ou a ressurreição, a teoria de Darwin ou a narrativa do Gênesis, e se o livro certo é a Bíblia ou o Corão, você está discutindo religião. Quando você fica perguntando se a instituição social é espírita kardecista, evangélica, ou católica, você está discutindo religião.

O problema é que toda vez que você discute religião você afasta as pessoas umas das outras, promove o sectarismo e a intolerância. A religião coloca de um lado os adoradores de Allá, de outro os adoradores de Yahweh, e de outro os adoradores de Jesus. Isso sem falar nos adoradores de Shiva, de Krishna e devotos do Buda, e por aí vai. E cada grupo de adoradores deseja a extinção dos outros, ou pela conversão à sua religião, o que faz com que os outros deixem de existir enquanto outros e se tornem iguais a nós, ou pelo extermínio através do assassinato em nome de Deus, ou melhor, em nome de um deus, com d minúsculo, isto é, um ídolo que pretende se passar por Deus.

Mas, quando você concentra sua atenção e ação, sua práxis, em valores como reconciliação, perdão, misericórdia, compaixão, solidariedade, amor e caridade, você está no horizonte da espiritualidade, comum a todas as tradições religiosas. E quando você está com o coração cheio de espiritualidade, e não de religião, você promove a justiça e a paz.

Os valores espirituais agregam pessoas, aproxima os diferentes, faz com que os discordantes no mundo das crenças se deem as mãos no mundo da busca de superação do sofrimento humano, que a todos nós humilha e iguala, independentemente de raça, gênero, e inclusive religião.

Em síntese, quando você vive no mundo da religião, você fica no ônibus. Quando você vive no mundo da espiritualidade que a sua religião ensina ou pelo menos deveria ensinar, você desce do ônibus e dá um ovo de páscoa para uma criança que sofre a tragédia e miséria de uma paralisia mental.

Ed René Kivitz, cristão, pastor evangélico e santista desde pequenininho.


Ilustração 1: Arte Postal de uma Oficina de Rua que orientei na década de 1990 - autor  (?).
ilustração 2: Joba Tridente

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Campanha: Doe Palavras!


DOE PALAVRAS!

O Hospital Mário Penna em Belo Horizonte, que cuida de doentes de câncer,lançou um projeto sensacional que se chama DOE PALAVRAS.

Fácil, rápido e todos podem doar um pouquinho.

Você acessa o site http://www.doepalavras.com.br/, escreve uma mensagem deotimismo, curta (como twitter) e sua mensagem aparece no telão para ospacientes que estão fazendo o tratamento.

Pessoal, é muito linda a reação de esperança dos pacientes.

Participem, não apenas hoje, mas, todos os dias, dêem um pouquinho das suas palavras e de seus pensamentos.

Priscila Gislaine

terça-feira, 13 de abril de 2010

Joba Tridente: O Pirulito Que Bate, Bate?


O Pirulito Que Bate, Bate?

o lado chulo da cantiga de roda

Já faz algum tempo que circula por aí (inclusive na Internet) um movimento (tolice?) de profissionais diversos querendo mudar as letras de todas as Cantigas de Roda contrárias à moral animal, humana, vegetal etc (com versos que incitam a violência, o medo, o racismo). Para quem busca um tema qualquer (pra defender) em troca de um valioso título de mestre ou de doutor..., aqui vai um que é um prato cheio de duplo sentido: Origem da (hoje) Cantiga de Roda Pirulito Que Bate, Bate.

Há cerca de três anos, pesquisando arquivos literários no Projeto Gutemberg, encontrei uma pérola raríssima: Álbum Chulo-Gaiato ou Colleção de Receitas Para Fazer Rir, de autor anônimo, publicado em 1862. Este material, postado por Pedro Saborano, que também colabora com a Biblioteca Digital Camões, é um daqueles achados que faz a gente confirmar que um bom texto é atemporal. Desde então acelerei minhas buscas na rede e fora dela, atrás de outras fontes que enriquecem ainda mais o achado. Li muita coisa estranha e outras nem tanto.

O Álbum Chulo-Gaiato é um volume recheado de prosa e verso sarcásticos, irônicos, safados, metafóricos, eróticos, românticos, pornográficos, chulos ao extremo e divertidíssimos do primeiro ao último parágrafo ou verso. Uma Colleção de Receitas Para Fazer Rir, inacreditavelmente atual, 147 anos depois da sua publicação, e tão boa que poderia até mesmo ser um texto perdido de Gregório de Matos (1623-1696) ou de Bocage (1765-1805).

Entre tantas Receitas me chamou a atenção uma informação meio que perdida entre parágrafos, mas uma verdadeira bomba: o possível significado da “nossa” Cantiga de Roda Pirulito Que Bate, Bate. Todos conhecem a inocente cantiga que embala o bebê e acompanha a criança da creche ao fundamental: Pirulito, que bate, bate. Pirulito que já bateu. Quem gosta de mim é ela. Quem gosta dela sou eu. Mas, quem conhece a canção original?


É claro que a Cantiga de Roda conhecida como Pirulito (ou Pirolito), assim como tantas outras (que o diga a polêmica: Atirei o pau no gato) tem lá seus acréscimos Brasil afora e adentro. Como esta, apresentada no Livro do Aluno - v.1 - Projeto Nordeste - Fundescola -Secretaria de Ensino Fundamental - 2000: Pirulito que bate, bate/ Pirulito que já bateu/ Quem gosta de mim é ela/ Quem gosta dela sou eu./ Ora palma, palma, palma/ Ora pé, pé, pé/ Ora roda, roda, roda/ Caranguejo peixe é./ Pirulito que bate, bate/ Pirulito que já bateu/ Que importa a você que eu bata/ Se eu bato no que é meu.

Ou esta versão de marcha de carnaval composta em 1939 por João de Barro, o Braguinha (1907-2006), com Alberto Ribeiro (1902-1971) e gravada por Nilton Paz (1919): Ioiô dá o braço pra Iaiá/ Iaiá dá o braço pra Ioiô/ O tempo de criança já passou, ô!/ Pirulito que bate bate/ Pirulito que já bateu/ Quem gosta de mim é ela/ Quem gosta dela sou eu, hei!/ Agora é melhor/ A gente dançar/ Juntinhos assim/ Se tem mais prazer/ Quem não dança o Pi...ru...lito/ Que alegria pode ter? Na verdade, a popular cantiga (da infância de Braguinha) aparece aqui mais como uma citação oportuna dentro da marcha. João de Barro compôs a marcha e não a cantiga Pirulito.

Ou ainda esta, publicada na Revista Fatebinho para Crianças – Ano II – nº 2 – outubro de 2006 – da Fateb - Faculdade de Telêmaco Borba, informando apenas que “A música ‘Pirulito que bate, bate’ é de origem africana, mas muitos não sabem disso.” Pirulito: Pirulito que bate, bate/ Pirulito que já bateu/ Quem gosta de mim é ela/ Quem gosta dela sou eu./ Pirulito que bate, bate/ Pirulito que já bateu/ A menina que eu amava/ Coitadinha já morreu.

Em Breves Apontamentos Sobre as Formas Musicais Existentes em Cabo Verde, a escritora Margarida Brito diz que: "(...) Outro género cultivado em Cabo Verde com tendência para o esquecimento, diz respeito à geração infantil. Aqui encontramos as Cantigas de Roda e as Lenga-Lengas cantadas, ou em forma de jogos rítmicos, com percussão corporal. Quem não se lembra das lenga-lengas "Una duna trina catarina barimbau são dez..." ou de "Doll in dol fatatitiná..." ou ainda da cantiga de roda "A vida do marujinho" dramatizada por tantas crianças, e muitas outras mais, que as deleitavam nas noites de luar em que a televisão não fazia parte das suas vidas, nas ilhas? É verdade que muitos podem dizer, e têm dito, que elas não nos pertencem, porque são portuguesas e/ou de outra cultura. Porém acabaram por se tornar numa "coisa nossa". Foram adoptadas pelos nossos tetravós e bisavós e muitas delas foram recriadas como é o caso de "pirolito qui bate qui bate" à qual se acrescenta uma estrofe em crioulo.


Como se vê, procurando a gente encontra versões para todos os gostos. Mas, voltando ao Pirulito (ou Pirolito) que interessa, o que me chamou a atenção foi saber que a inocente (até então para mim) Cantiga de Roda não é tão inocente assim. Ou pelo menos não era, no século XIX, lá em Portugal (?), para o autor de Álbum Chulo-Gaiato ou Colleção de Receitas Para Fazer Rir. Basta ler o que é dito (com a grafia original) em um trecho da hilária Pratica feita á missa do dia pelo muito reverendo prior de...:

(...) “Aqui não ha senão desordem e immoralidade. Immoralidade nos velhos, immoralidade nos moços, immoralidade nos grandes, immoralidade nos pequenos.
Digo immoralidade nos velhos, porque esses velhos, raça damnada de Caim, depois de haverem passado toda a vida... em patuscadas e pandigas, ainda mesmo arrumados ao bordão e de cabeça calva, se vão metter em logares suspeitos! Infames velhos de Suzana! quando é que lhes acabarão as furias carnaes e burriçaes?

Immoralidade nos moços. Os rapazes e as raparigas andam por essas ruas aos beijos e abraços, cantando cantigas indecentes e immoraes; ainda eu hontem ouvi a filha do Thomaz da Horta e o filho do Ignacio do Dente a cantarem o Pirolito que bate que bate! Ora não ha maior pouca vergonha, uns fedelhos que ainda cheiram a coeiros e já sabem o que isto quer dizer!


Immoralidade nos grandes. Esses mariolões e essas mocetonas que vão todos os dias para o matto, sob pretexto de que vão buscar lenha, e por fim fazem por lá couzas do arco da velha... Lenha no forno queriam ellas, malditas!

E quando vão aos figos! O que acontece?”


Será que este Pirolito que bate bate de 1862 é outro? Ou será que é uma versão mais sacana deste Pirolito – Cantiga das Ruas, publicado em 1893 no livro Cancioneiro de Musicas Populares, recolhidas (e escrupulosamente trasladada para canto e piano) por César A. das Neves e com prefácio do Dr. Theophilo Braga? Na partitura da cantiga há uma dedicatória: À Ex.ma Snr.a D. Maria Portella Sobral. No rodapé da página uma informação: Foi esta uma das musicas com que o Visconde de Castilho fez cantar, nas escolas primárias em 1850, o seu methodo repentino de leitura.

Esta é a versão mais antiga que encontrei: Tu dizes que não, que não,/ Inda has de vir a querer;/ Tanto dá a água na pedra/ Que a faz amollecer./ Pirolito que bate bate. Pirolito que já bateu;/ Quem gosta de mim é ella,/ Quem gosta d’ella sou eu./ Meu amor, quem cala vence,/ Mais vence que não diz nada;/ Em certa occasiões,/ Mais vale bocca calada./ Quem de mim te poz tão longe,/ não teve boa eleição;/ Quanto mais longe da vista,/ Mais perto do coração./ Muito padece quem ama,/ Mais padece quem adora, Mais padece quem não vê/ O seu amor a toda hora. / Eu hei de te amar, amar,/ Hei de te querer, querer;/ Hei de te tirar de casa/ Sem seu pae, nem mae saber.

Vou continuar pesquisando.
Talvez encontre uma versão em mandarim.

Joba Tridente - março de 2009
Ilustrações: fac-símiles de Cancioneiro e dings: WasWoodcuts, Little People

domingo, 21 de março de 2010

Joba Tridente: Autorretrato – IX


Autorretrato – IX
excerto – III


trago comigo, há anos, a múmia de um cigarra
encontrei morta nas terras de Ilhéus

não sabia que era uma cigarra
tampouco me lembrava que cantava até morrer
sabia apenas do seu mágico canto
que vazou para o infinito estrelado

misturado ao som’baque
do quebrar das ondas nas praias
num indo e vindo contínuo
na querência de eterna mente espelhar a lua

minha cigarra-múmia não canta mais, bem sei
mas trago comigo, pra sempre,
a lembrança do seu canto

quem se banhou com ele, ao menos uma vez,
sabe que é impossível, felizmente, retirá-lo dos poros
retirá-lo das células onde, feito tatuagem, ele se aninha...


ilustração (?)

domingo, 7 de março de 2010

Joba Tridente: Mulher de Segunda

Arte de Joba Tridente sobre Dins - 2010 - Mulher de Segunda

Mulher de Segunda

Há 11 anos escrevi esta crônica
para reflexão e alguma comemoração
no Dia Internacional da Mulher: 08/03/1999.
Infelizmente ela continua atual.


O ônibus é grande. Trem sobre rodas, dizem. Meio devagar. Articulado. Certas horas do dia, lotado. Alternando as estações a voz da moça, presa no alto-falante, repete a mensagem, a ouvidos praticamente surdos: “Dê preferência às pessoas idosas, gestantes e deficientes”. Fala para uma geração recente de dez, vinte e até trinta anos, que já nasceu podre. Mulheres e homens. Gente louca para entrar no veículo e se sentar antes do outro. À mensagem da voz, aos apelos da voz, aos desejos da voz se fazem de cegos.

Arte sobre Dings - Mulher de Segunda - 2010: Joba Tridente

Manhã. Itinerário: centro. Ônibus razoavelmente cheio. Todos os lugares tomados principalmente por gente jovem. No último banco uma menina de uns 10 anos, confortavelmente sentada ao lado de uma senhora, de uns trinta anos, olhando curiosa, em pé, ali perto delas, entre outras, uma velha senhora de uns 60 anos, gorda e exausta com o calor. Ela sabe que aquela mulher é idosa e em atenção à recomendação da voz, questiona a sua mãe:

Mãe, uma mulher idosa pode ter filho? De onde você tirou essa idéia maluca? Da moça do alto-falante? Que moça? Essa que tá falando pra dá preferência às pessoas idosas gestantes. Não é idosas gestantes é idosas e gestantes. Ah! Mas mulher idosa pode ter filhos? Não é recomendado? Por que? Porque ela é muito velha, não resistiria ao parto. E não pode fazer cesariana? Ela continua muito velha. Só por isso? Não! Se ela é muito velha como é que vai poder brincar e educar o seu filho? Mas a vó é velha e brinca com a gente, ensina a gente. Ora, a sua vó é a minha mãe. Mas a mãe do pai também é legal com a gente. É porque ela é parente. Ah! Mas e se... Jaquelaine Elizabetchi, você não acha que é nova demais pra ficar falando sobre isso, não? Toma, leia uma revista, pra passar o tempo. Veja a seção de regimes, pra você se cuidar e não ficar igual a essa senhora, que nem aguenta ficar em pé, de tão gorda. E se você não se cuidar agora que é criança... Mãe. O que é, agora? Eu devo dar o meu lugar pra essa mulher idosa e gorda? É claro que não, você pagou a passagem. Mas no alto-falante... É bobagem! Ninguém liga. Eu duvido que se ela estivesse sentada ela dava o lugar dela pra você. Além do que ela é muito gorda e eu vou ficar muito apertada. Ah!

Arte sobre Dings - Mulher de Segunda: Joba Tridente - 2010

Tarde. Itinerário: bairro. Ônibus razoavelmente cheio. Todos os lugares tomados principalmente por gente jovem. No banco reservado a idosos ou deficientes uma jovem de uns 20 anos, confortavelmente sentada e ouvindo a todo volume, com fone no ouvido, uma radio brega qualquer. Em pé, ao lado, uma senhora, de uns quarenta e cinco anos, com uma perna engessada, e os olhos tomados pela catarata. A jovem olha curiosa para senhora em pé, ali perto dela, mas é como se não a visse ou como se não desse a mínima. Um homem de uns cinquenta e poucos anos, cabelos brancos, se aproxima da moça e fala alguma coisa com ela que, é claro, não escuta, com a altura da música. O senhor, então, arranca-lhe os fones de ouvido e antes que ela reaja, pega a cabeça dela e sem violência, mas com firmeza, gira-a de frente para a mulher. Ergue e abaixa a cabeça da jovem para que ela olhe e veja o estado da senhora e depois gira-a para a janela, onde está o selo de reserva. A jovem, vociferando, dá um inesperado chute no velho. Outros passageiros alheios ou espectadores acreditando ser um assalto, caem de pancada no velho que é expulso do ônibus, na próxima parada, todo machucado. A jovem retoma o seu assento e o seus fones de ouvidos. A música ensurdecedora que ela ouve é uma breguice religiosa qualquer.

Arte sobre Ding - Mulher de Segunda - Joba Tridente - 2010

Noite. Itinerário: centro. Ônibus razoavelmente cheio. Todos os lugares tomados principalmente por gente jovem. Num banco, no primeiro carro, um rapaz de uns 18 anos, confortavelmente sentado, ao perceber a entrada de uma senhora, de uns sessenta e poucos anos, se apressa em lhe oferecer o lugar. A senhora, magra e elegante, vestida com bom gosto, maquiagem discreta e cabelos prateados presos à moda diva, com bonita presilha, sapatos e bolsa combinando, agradece e rejeita a oferta. Um senhor cinquentão, que não tinha visto a cena, repete o gesto, oferecendo o seu lugar. O que é novamente recusado de forma bastante educada. Um pouco atrás, assistindo a tudo, duas senhoras quarentonas. Donas de casa, talvez. Ou funcionárias de uma empresa qualquer. Não importa. Não interessa. Derrubadas:

É inacreditável, duas pessoas oferecem o lugar e “a princesa” recusa. Deve se achar madame demais. Perua demais, você quer dizer, né amiga. Quando ninguém oferece o lugar dizem que todo mundo é mal educado. Com essa cara cheia de rugas e esse cabelo branco, que não engana nem cego, ela pensa que vai convencer a quem, de que não é velha? Menina, você viu os pés de galinha? E os sapatos combinandinho com a bolsa? Isso fica bem em mulher jovem e não em mulher velha. Tem gente que não se toca, viu. Aposto que usa dentadura fixada com aquele talquinho. Deus me livre de chegar nessa idade e toda metida assim. E eu, então!? Pra andar sozinha de ônibus ou deve ser solteirona ou viúva. A essa hora, só pode! Ou sapatão, né? Tudo é possível. Ela deve ter, no mínimo, uns oitenta anos. No mínimo!. Mas pensa que aparenta cinquenta. Nem morta! Você reparou no vestido? Deve ter copiado de alguma vitrine. Não tem nem um bom caimento. E o tecido? Isso lá é tecido pra gente velha? Mas as mãos dela estão bem feitas. Você deve estar cega, aquele esmalte já caiu de moda há séculos. É mesmo! Shhhhiiii, que a dondoca vai descer. Elvira do céu, se viu o velho que está esperando por ela? Com beijinho na boca e tudo. Até que ele está bem vestido. Possivelmente vão a algum velório. O deles mesmo. A não ser que sejam casados. Imagina! Nessa idade, vestidos desse jeito, beijinhos. Hoje em dia, os casamentos não duram dois anos. Sabe que você tem razão, Marlene, o meu não chegou a três, com filhos e tudo. O meu até que tá durando, já vou pro quinto. Mas tenho que fazer muita vista grossa, por causa dos quatro filhos, né. Imagino!

Ilustrações: Arte de Joba Tridente sobre Dings

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Joba Tridente: Ovo Afogado


Ovo Afogado
da série Pombagens

da chuva
na calha encalhando
gravetos vieram
a calhar um ninho
pra uma tola
pomba não rola
afogar o próprio ovo


arte sobre Calligraphic Ornaments: Joba Tridente

domingo, 31 de janeiro de 2010

Joba Tridente: Telefonema

Arte sobre Dings: Telefonema - Joba Tridente


Telefonema

trrrrriiiiimmmmmnnnnn...

telefonema na madrugada
quando trote...
xinga-se por ser trote
quando notícia ruim...
xinga-se por não ser trote

ilustração arte sobre ding anos 50: Joba Tridente

domingo, 24 de janeiro de 2010

Joba Tridente: Eu vi! Eu sei! Eu li!

Ilustração de Joba Tridente: Eu vi! Eu sei! Eu li - Falas ao Acaso

Eu vi! Eu sei! Eu li!
da coletânea de crônicas: Catarse Tardia

Um homem foi preso, ontem. Eu vi! Tentava roubar uma bandeira nacional, do pavilhão, na praça do governo. Os homens que o prenderam eram brutos. Eram montes enormes. Eu sei! Usavam armas de última geração. Dessas que matam sem deixar marcas. Eu li!

O homem desapareceu no meio dos grandes. Como um afogado. Depois voltou a aparecer. Só a cabeça. Como um afogado. Os prendedores eram como ondas. Não havia salva-vidas, ali. Só grandes ondas e um pequeno homem se debatendo no meio delas. Alguns pombos voavam. Corujas também. O homem resistia à tormenta das ondas. Parecia não aguentar nadar por muito mais tempo. Faltava-lhe o ar. Engasgava-se. Dizem que o sangue é doce. Também salgado. Talvez acre-doce. Assim como o mar.

Um náufrago morreu na praia, hoje. Eu vi! Dizem que estava bêbado e saiu pra pescar tubarões, em alto mar, além das 200 milhas. Foi atacado por orcas e peixes-espada. Eu sei! Os jornais disseram outra coisa. É difícil saber a verdade. É palavra de pescador contra de informador. Um colunista disse ouvir dizer de uma fonte confiável que, antes de morrer na praia, o homem cuspiu algumas palavras. Elas foram gravadas, por um anônimo e estão sendo analisadas por peritos, em um Laboratório de Fonética Forense. A sua fonte adiantou que os técnicos estão confusos. O que o homem parece dizer não bate com a explicação dos pescadores. A gravação diz que ele saiu pra pescar uma bandeira nacional. Como é que alguém pode ir pescar uma bandeira em alto mar? A voz, na fita, diz que a bandeira era pra fazer roupa pros seus filhos. Entre outras coisas o náufrago morto alega que seus filhos, depois, vestidos de bandeira, seriam uma bandeira viva andando pelas ruas. E não um simples pedaço de pano voando ao léu... Eu li!

Joba Tridente: 16.04.1998

Ilustração de Joba Tridente

domingo, 10 de janeiro de 2010

Joba Tridente: Visão Geral da Literatura

arte (?) *

Visão Geral da Literatura
O lado “B” da literatura “A” na Internet

Esta série de cinco artigos, que escrevi em 2001, foi publicada no Caderno G, da Gazeta do Povo, de Curitiba, no segundo semestre do mesmo ano.
Este é o último artigo sobre obras literárias oferecidas gratuitamente aos internautas que buscam navegar além dos efeitos especiais dos mais diversos portais. Poderia continuar sugerindo o que há de melhor na literatura brasileira e estrangeira durante muito tempo, já que a cada dia novas obras, de domínio público, caem na rede e, sem dúvida alguma, merecem ser pescadas e deliciosamente saboreadas. Mas a idéia era usar um samburá e pegar apenas algumas, para dar ao leitor uma breve idéia do mundo fascinante da literatura de qualidade, feita para os leitores e não para os críticos.

O convite final, no entanto, é para que aquele leitor que adora ser surpreendido com um bom texto, se for preciso, vença o desinteresse do tema, o preconceito ou a “razão pessoal”, e bote os olhos em obras que fogem do lugar comum, como: Um Tratado da Cozinha Portuguesa do séc. XV, de autor anônimo, que é bem capaz de tornar os mais famintos em sofisticados e poéticos chefes de cozinha; Bom-Criolo, de Adolfo Caminha (1867-1897), obra corajosa e de um lirismo capaz de trincar seriamente qualquer radicalismo sexual; A Alma Encantadora das Ruas, de João do Rio (1881-1923), uma inesquecível seleção de crônicas para conhecer, amar e sentir saudades de um Rio de Janeiro antigo que, em alguns momentos, parece estar parado no tempo.

Vale lembrar que, além das obras de domínio público, também são distribuídas obras diversas, de autores contemporâneos editados ou não por algumas bibliotecas virtuais. O fato de elas serem oferecidas gratuitamente não quer dizer que não tenham qualidade ou que estão ali porque foram recusadas pelas editoras de marca. O que está acontecendo é que muitos autores estão experimentando e apostando numa novidade editorial em busca de novos leitores. Um exemplo disso é o livro Às Moscas, armas!, de Nelson de Oliveira. A obra é uma excelente coletânea de contos e está disponível na Catatau Editora. Nelson recebeu o Prêmio Casa de Las Américas em 1995 e venceu o Concurso de Contos da Fundação Cultural da Bahia em 1996).

Alguns leitores, mais saudosistas, se recusam a instalar aplicativos para ler as obras editadas nos formatos PDF e/ou eBook, porque acham cansativo ficar sentados em frente do computador lendo um texto literário. No entanto são capazes de passar horas vagando por poluidíssimas páginas e/ou simplesmente trabalhando em algum texto próprio. A desculpa é a de que o aplicativo eBook não se compara ao livro de papel que se carrega para todo lado, inclusive para a cama, e que o e-Book portátil, que se carrega para onde quiser, custa muito caro. O aplicativo Acrobat eBook Reader, além de aceitar textos em PDF, como todo e-Book também permite fazer anotações, marcar e destacar texto na página, como se faz em qualquer livro de papel, além de ser mais prático e rápido na busca de palavras. Talvez o mais interessante nesses aplicativos, que funcionam como uma biblioteca, já que são capazes de armazenar vários livros, é que, ao contrário dos impressos, eles possibilitam aumentar bem o tamanho das letras, aliviando as vistas cansadas de tanta leitura e tranquilizando as mentes ainda carentes.


*Encontrei esta bonita ilustração (sem a autoria) num site da SEED-PR, que também oferece download de excelentes obras literárias em Domínio Público.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Livro: Lendas do Mundo Todo



Lendas do Mundo Todo
O lado “B” da literatura “A” na Internet

Esta série de cinco artigos, que escrevi em 2001, foi publicada no Caderno G, da Gazeta do Povo, de Curitiba, no segundo semestre do mesmo ano.


Neste quarto artigo sobre as obras disponibilizadas gratuitamente na internet, através de diversas bibliotecas virtuais, e que merecem a atenção de todo leitor que gosta realmente de um bom texto, a sugestão fica com as curiosas Lendas do Mundo Todo, oferecidas pela Virtual Books.

Numa época em que o apagão quase nacional, por força da Natureza fragilizada pelo homem, sugere um recuo na evolução tecnológica, e que por um bom tempo os eletroeletrônicos deverão ser poupados, reunir a família e contar histórias à luz de velas, pode ser uma ótima oportunidade para passar o tempo.

Para os pais, tios, avós que se acham pouco sensíveis e sem criatividade, contemporâneos demais para contar histórias de reis e rainhas, anjos e demônios, príncipes e princesas, fadas e bruxas, uma navegada digital nas Lendas do Mundo Todo, pode ser uma boa solução. Quem já sabe de cor e salteado os antológicos e fascinantes contos de Andersen, Irmãos Grimm, Dickens, vai ter uma surpresa e tanto. Os profissionais contadores de histórias e professores que gostam de trabalhar o lado lúdico, mágico e fantasioso, sem nenhuma culpa, das crianças, também.

São trinta lendas catalogadas e disponibilizadas para todos os gostos: fantasia, terror, humor, absurdo, edificante, moralista, fabulista, religiosa, profana, que podem ser recebidas até por e-mail. Possível fruto de uma já esquecida tradição oral, a obra digitalizada foi compilada do livro Os Mais Belos Contos da Polônia, editado em 1948, em Portugal, que não traz o nome do autor/compilador. O leitor que cresceu ouvindo ou lendo contos de fadas, com certeza vai reconhecer muitos deles, recontados com outra roupagem. Algumas lendas, inclusive, agregam duas ou três outras, mas não ficam com cara de “lenda doida”.

As Lendas do Mundo Todo têm tudo para agradar o leitor de qualquer idade. É claro que se levando em conta o estado de espírito com que ele vai mergulhar de corpo e alma na leitura. Se for do tipo experimentalista que gosta de embromação, do texto vazio que parte de lugar nenhum para lugar algum, é melhor que fique longe. Mas, se for do tipo que busca uma leitura descompromissada, porém divertida, deve copiar todas e ir sorvendo aos poucos, porque são lendas curtas que acabam sempre antes da hora.

Destacar uma ou outra não é tarefa fácil. Vai muito do gosto pessoal de cada um. Mas, a título de curiosidade, com certeza, o leitor mais atencioso vai reconhecer em A Cotovia, uma famosíssima lenda que virou um clássico belíssimo no cinema, nas mãos de Jean Cocteau, e, recentemente, da equipe Disney, assim como Os Três Guerreiros, que ganhou diversas versões em desenho animado, uma delas protagonizada pelo Mickey. Outra curiosidade é uma das lendas ter duas versões.

Fora isso, tem a divertida história de uma princesa que, para não ficar solteira, está disposta a se casar até com um burrico; um príncipe que acaba virando um asno; uma criança que nasce com barba; um homem que não consegue parar de fumar; um anão que tem uma mosca que inferniza a vida de todo mundo; uma disputa estranhíssima entre um boi, um macaco e um porco...

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