quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Gabriela Mistral: Todas íamos ser rainhas


A escritora chilena Gabriela Mistral foi a primeira autora latino-americana a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, em 1945. Os escritores só começaram a compor a lista vinte e dois anos depois, com o guatemalteco Miguel Ángel Asturias (1899-1974), em 1967; o chileno Pablo Neruda (1904-1973), em 1971, o colombiano Gabriel García Márquez (1927-2014), em 1982; o mexicano Octavio Paz (1914-1998), em 1990; o peruano Mario Vargas Llosa (1966), em 2010. Diplomata, feminista e pedagoga, Gabriela Mistral (1889-1957), cujo retrato ilustra a nota de cinco mil pesos chilenos, é dona de uma poesia pungente (mas sem perder o lirismo ao falar de amor e ou de dor) e de uma prosa incômoda e reflexiva (ao abordar temas relacionados à educação e ao papel da mulher e do índio na sociedade, principalmente na América Latina). Há um bom material, na internet, sobre a autora do premiado Sonetos de La Muerte, Tala e Desolación..., veja alguns links na sua biografia abaixo.

Para esta breve homenagem a Gabriela Mistral selecionei quatro poemas, que serão publicados (um a cada dia) ao longo da semana, no original espanhol e em tradução para o português. O primeiro foi Medo. O segundo foi A Terra. O terceiro foi Gotas de Fel. Encerro com o belíssimo poema-prosa Todas íbamos a ser reinas, ou Todas íamos ser rainhas, em tradução cativante da escritora brasileira Henriqueta Lisboa.., presente em Poemas escolhidos de Gabriela Mistral (Delta, 1969).


                  

Todas íbamos a ser reinas
Gabriela Mistral

Todas íbamos a ser reinas,
de cuatro reinos sobre el mar:
Rosalía con Efigenia
y Lucila con Soledad. 

En el valle de Elqui, ceñido
de cien montañas o de más,
que como ofrendas o tributos
arden en rojo y azafrán,

Lo decíamos embriagadas,
y lo tuvimos por verdad,
que seríamos todas reinas
y llegaríamos al mar.

Con las trenzas de los siete años,
y batas claras de percal,
persiguiendo tordos huidos
en la sombra del higueral,

De los cuatro reinos, decíamos,
indudables como el Korán,
que por grandes y por cabales
alcanzarían hasta el mar.

Cuatro esposos desposarían,
por el tiempo de desposar,
y eran reyes y cantadores
como David, rey de Judá.

Y de ser grandes nuestros reinos,
ellos tendrían, sin faltar,
mares verdes, mares de algas,
y el ave loca del faisán.

Y de tener todos los frutos,
árbol de leche, árbol del pan,
el guayacán no cortaríamos
ni morderíamos metal.

Todas íbamos a ser reinas,
y de verídico reinar;
pero ninguna ha sido reina
ni en Arauco ni en Copán. 

Rosalía besó marino
ya desposado en el mar,
y al besador, en las Guaitecas,
se lo comió la tempestad.

Soledad crió siete hermanos
y su sangre dejó en su pan,
y sus ojos quedaron negros
de no haber visto nunca el mar.

En las viñas de Montegrande,
con su puro seno candeal,
mece los hijos de otras reinas
y los suyos no mecerá.

Efigenia cruzó extranjero
en las rutas, y sin hablar,
le siguió, sin saberle nombre,
porque el hombre parece el mar.

Y Lucila, que hablaba a río,
a montaña y cañaveral,
en las lunas de la locura
recibió reino de verdad.

En las nubes contó diez hijos
y en los salares su reinar,
en los ríos ha visto esposos
y su manto en la tempestad.

Pero en el Valle de Elqui, donde
son cien montañas o son más,
cantan las otras que vinieron
y las que vienen cantarán:

?«En la tierra seremos reinas,
y de verídico reinar,
y siendo grandes nuestros reinos,
llegaremos todas al mar».



Todas íamos ser rainhas
Gabriela Mistral
tradução: Henriqueta Lisboa

Todas íamos ser rainhas
de quatro reinos sobe o mar:
Rosália com Efigênia
e Lucila com Soledade.

Lá no vale de Elqui, cingido
por cem montanhas, talvez mais,
que com dádivas ou tributos
ardem em rubro ou açafrão,

nós dizíamos embriagadas
com a convicção de uma verdade,
que havíamos de ser rainhas
e chegaríamos ao mar.

Com aquelas tranças de sete anos
e camisolas de percal,
perseguindo tordos fugidos
sob a sombra do figueiral,

dizíamos que nos nossos reinos,
dignos de fé como o Corão,
seriam tão perfeitos e amplos
que se entenderiam ao mar.

Quatro esposos desposaríamos
quando o tempo fosse chegado,
os quais seria reis e poetas
como David, rei de Judá.

E por serem grandes os reinos
eles teriam, por sinal,
mares verdes, repletos de algas
e a ave selvagem do faisão.

Por possuírem todos os frutos,
a árvore do leite e do pão,
o guaiaco não cortaríamos
nem morderíamos metal.

Todas íamos ser rainhas
e de verídicos reinar;
porém nenhuma foi rainha
nem no Arauco nem em Copásn…

Rosália beijou marinheiro
que já tinha esposado o mar,
e ao namorador nas Guaitecas
devorou-o a tempestade.

Sete irmãos criou Soledade
e seu sangue deixou no pão.
E seus olhos quedaram negros
de nunca terem visto o mar.

Nos vinhedos de Montegrande
ao puro seio de trigal,
nina os filhos de outras rainhas
porém os seus nunca, jamais.

Efigênia achou estrangeiro
no seu caminho e sem falar
seguiu-o sem saber-lhe o nome
pois o homem se assemelha ao mar.

Lucila que falava ao rio,
às montanhas e aos canaviais,
esta, nas luas da loucura
recebeu reino de verdade.

Entre as nuvens contou dez filhos,
fez nas salinas seu reinado,
viu nos rios os seus esposos
e seu manto na tempestade.

Porém lá no vale de Elqui,
onde há cem montanhas ou mais,
cantam as outras que já vieram,
como as que vieram cantarão:

Na terra seremos rainhas
e de verídico reinar,
e sendo grandes os nossos reinos,
chegaremos todas ao mar.

*
ilustração de Joba Tridente.2018


Gabriela Mistral (nasceu Lucila de María del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga em Vicuña/Chile: 07.04.1889 e morreu em Nova York/EUA: 10.01.1957) foi educadora, diplomata, feminista e escritora agraciada com o Nobel de Literatura de 1945. O pseudônimo Gabriela Mistral, em homenagem aos poetas Gabriele D’Annunzio (italiano) e Frédéric Mistral (francês), nasceu em 1914, ao ganhar o Concurso de Poesia Juegos Florais de Santiago com Sonetos de La Muerte. Em 1922 publicou seu primeiro livro de poesias, Desolación, ano em que foi convidada pelo Ministério da Educação do México a trabalhar nos Planos de Reforma Educacional, tornando-se referência em pedagogia. Gabriela foi Secretária do Instituto de Coperación Intelectual de la Sociedade de Naciones e Consulesa do Chile e também redatora da revista El Tiempo, de Bogotá e escreveu para o Jornal do Brasil. Viajou pela Europa, Estados e América Latina representando seu país e ou orientando conferências culturais. Seus poemas são pungentes e tematizam tanto o amor quanto a dor. A sua bibliografia traz os seguintes títulos: Desolación (1922); Lectura para mujeres (1924); Ternura (1924); Tala (1938); Lagar (1954); Recados contando a Chile (1957); Páginas en prosa (1962); Los motivos de San Francisco (1965); Poema de Chile (1967); Cartas de amor de GM (1978); Materias (1978); Gabriela piensa en...Santiago de Chile (1978); Prosa religiosa de GM (1978); GM en el "Repertorio Americano" (1978); Gabriela anda por el mundo (1978); Grandeza de los ofícios (1978); Croquis mexicanos (1979); Magisterio y niño (1979); Elogios de las cosas de la tierra (1979); Magistério y Niño (1982); Epistolario de G M y Eduardo Barrios (1988); G M y Joaquín García Monge (1989); Vendré olvidada o amada (1989); Italia caminada (1989); Poesías completas (1989); Memorias y correspondencia con G M y Jacques Marit (1989); Lagar II (1991); En batalla de sencillez (1993); Vuestra Gabriela (1995); Epistolario de G M e Isolina Barraza (1995); Dolor (2001). Para saber mais: Templo Cultural Delfos: Gabriela Mistral - uma viagem pela linguagem poética; Cultura UNAM: Gabriela Mistral – Poesia Moderna; Blog da Inês Büschel:  Gabriela Mistral - Prêmio Nobel de Literatura ; Poetry Foundation: Gabriela Mistral; Antonio Miranda: Gabriela Mistral;  PGL.gal: Gabriela Mistral: filme ‘A Gabriela’ e vários documentários; Vermelho: Gabriela Mistral, para ler à noite, perder o sono e ter pesadelos; Blog Oficial: Gabriela Mistral; Memória Chilena: Gabriela Mistral: A Cien Años de su Nascimiento; Chile para Niños: Gabriela Mistral - Vida y Pensamiento; Repositório Unicamp: Gabriela Mistral: das danças de roda de uma professora consulesa no Brasil; Poemas del Alma: Poemas de Gabriela Mistral; wlu.edu: Gabriela Mistral; My poetic Side: Gabriela Mistral Poems; Via Negativa: Mapping a different star: five poems by Gabriela Mistral; Numéro Cinq: Gabriela Mistral: The Archangel, The Wind; Kate Sharpley Library: Chilean Poet Gabriela Mistral and Anarchism.

Henriqueta Lisboa (Lambari/MG 1901 - Belo Horizonte/MG 1985) foi professora de Literatura Hispano-Americana na Universidade Católica de Minas Gerais e na Universidade Federal de Minas Gerais, escritora, ensaísta e tradutora. Por sua admirável literatura, transitando entre o simbolismo e o modernismo, Henriqueta Lisboa foi agraciada com diversos prêmios literários: Prêmio Olavo Bilac de Poesia (1929); Prêmio Othon Bezerra de Mello (1952); Prêmio de Poesia Pen Club do Brasil (1984); Prêmio Machado de Assis (1984). O seu primeiro livro, Fogo Fátuo, foi lançado em 1929, aos 21 anos. Seguiram-se a ele: Enternecimento (1929); Velário (1936); Prisioneira da noite (1941); O menino poeta (1943); A face lívida (1945); Flor da morte (1949); Madrinha Lua (1952); Azul profundo (1955); Lírica (1958); Montanha viva (1959); Além da imagem (1963); Nova Lírica (1971); Belo Horizonte bem querer (1972); O alvo humano (1973); Reverberações (1976); Miradouro e outros poemas (1976); Celebração dos elementos: água, ar, fogo, terra (1977); Pousada do ser (1982); Poesia Geral (1985). Henriqueta traduziu os Cantos, de Dante Alighieri (1969), e Poemas Escolhidos de Gabriela Mistral (1969). Para saber mais sobre a autora, que foi a primeira mulher eleita membro da Academia Mineira de Letras, em 1963, e entre 1961 e 1968 organizou a Antologia Poética Para a Infância e a Juventude e da Literatura Oral Para a Infância e Juventude: Antonio Miranda/Brazilian Poetry: Henriqueta Lisboa; Scripta/Ângela Vaz Leão: Henriqueta Lisboa: a poesia transcodificada; Nau Literária/Adriana Rodrigues Machado: Henriqueta Lisboa: a morte como florescimento do ser; Revista de Letras/Carla Francine da Silva Reis: Henriqueta Lisboa e a Educação Estética da Criança; Scripta/Reinaldo Marques: Henriqueta Lisboa: tradução e mediação cultural; Templo Cultural Delfos: Henriqueta Lisboa - desbravadora de caminhos.


quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Gabriela Mistral: Gotas de Fel


A escritora chilena Gabriela Mistral foi a primeira autora latino-americana a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, em 1945. Os escritores só começaram a compor a lista vinte e dois anos depois, com o guatemalteco Miguel Ángel Asturias (1899-1974), em 1967; o chileno Pablo Neruda (1904-1973), em 1971, o colombiano Gabriel García Márquez (1927-2014), em 1982; o mexicano Octavio Paz (1914-1998), em 1990; o peruano Mario Vargas Llosa (1966), em 2010. Diplomata, feminista e pedagoga, Gabriela Mistral (1889-1957), cujo retrato ilustra a nota de cinco mil pesos chilenos, é dona de uma poesia pungente (mas sem perder o lirismo ao falar de amor e ou de dor) e de uma prosa incômoda e reflexiva (ao abordar temas relacionados à educação e ao papel da mulher e do índio na sociedade, principalmente na América Latina). Há um bom material, na internet, sobre a autora do premiado Sonetos de La Muerte, Tala e Desolación..., veja alguns links na sua biografia abaixo.

Para esta breve homenagem a Gabriela Mistral selecionei quatro poemas, que serão publicados (um a cada dia) ao longo da semana, no original espanhol e em tradução para o português. O primeiro foi Medo. O segundo foi A Terra. Hoje é a vez de Gotas de Fel, em tradução de Ruth Sylvia de Miranda Sales, presente em Gabriela Mistral e Cecília Meireles - Gabriela Mistral y Cecília Meireles (Academia Brasileira de Letras e Academia Chilena de La Lengua, 2003).


                  

GOTAS DE HIEL
Gabriela Mistral

No me cantes: siempre queda
a tu lengua apegado
un canto: el que debió ser entregado.

No beses: siempre queda,
por maldición extraña,
el beso al que no alcanzan las entrañas.

Reza, reza que es dulce: pero sabe
que no acierta a decir tu lengua avara
el sólo Padre Nuestro que salvara.

Y no llames la muerte por clemente,
pues en las carnes de blancura inmensa,
un jirón vivo quedará que siente
la piedra que te ahoga
y el gusano voraz que te destrenza.



GOTAS DE FEL
Gabriela Mistral
Tradução: Ruth Sylvia de Miranda Salles
  
Não cantes: sempre fica
à tua língua apegado
um canto: o que faltou ser enviado.

Não beijes: sempre fica,
por maldição estranha,
o beijo a que não chegam as entranhas.

Reza, reza que é bom; mas reconhece
que não sabes, com tua língua avara,
dizer um só Pai Nosso que salvara.

E não chames a morte de clemente,
porque, na carne que a brancura alcança,
uma beirada viva fica e sente
a pedra que te afoga
e o verme voraz que te destrança.

*
ilustração: Joba Tridente.2018


Gabriela Mistral (nasceu Lucila de María del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga em Vicuña/Chile: 07.04.1889 e morreu em Nova York/EUA: 10.01.1957) foi educadora, diplomata, feminista e escritora agraciada com o Nobel de Literatura de 1945. O pseudônimo Gabriela Mistral, em homenagem aos poetas Gabriele D’Annunzio (italiano) e Frédéric Mistral (francês), nasceu em 1914, ao ganhar o Concurso de Poesia Juegos Florais de Santiago com Sonetos de La Muerte. Em 1922 publicou seu primeiro livro de poesias, Desolación, ano em que foi convidada pelo Ministério da Educação do México a trabalhar nos Planos de Reforma Educacional, tornando-se referência em pedagogia. Gabriela foi Secretária do Instituto de Coperación Intelectual de la Sociedade de Naciones e Consulesa do Chile e também redatora da revista El Tiempo, de Bogotá e escreveu para o Jornal do Brasil. Viajou pela Europa, Estados e América Latina representando seu país e ou orientando conferências culturais. Seus poemas são pungentes e tematizam tanto o amor quanto a dor. A sua bibliografia traz os seguintes títulos: Desolación (1922); Lectura para mujeres (1924); Ternura (1924); Tala (1938); Lagar (1954); Recados contando a Chile (1957); Páginas en prosa (1962); Los motivos de San Francisco (1965); Poema de Chile (1967); Cartas de amor de GM (1978); Materias (1978); Gabriela piensa en...Santiago de Chile (1978); Prosa religiosa de GM (1978); GM en el "Repertorio Americano" (1978); Gabriela anda por el mundo (1978); Grandeza de los ofícios (1978); Croquis mexicanos (1979); Magisterio y niño (1979); Elogios de las cosas de la tierra (1979); Magistério y Niño (1982); Epistolario de G M y Eduardo Barrios (1988); G M y Joaquín García Monge (1989); Vendré olvidada o amada (1989); Italia caminada (1989); Poesías completas (1989); Memorias y correspondencia con G M y Jacques Marit (1989); Lagar II (1991); En batalla de sencillez (1993); Vuestra Gabriela (1995); Epistolario de G M e Isolina Barraza (1995); Dolor (2001). Para saber mais: Templo Cultural Delfos: Gabriela Mistral - uma viagem pela linguagem poética; Cultura UNAM: Gabriela Mistral – Poesia Moderna; Blog da Inês Büschel:  Gabriela Mistral - Prêmio Nobel de Literatura ; Poetry Foundation: Gabriela Mistral; Antonio Miranda: Gabriela Mistral;  PGL.gal: Gabriela Mistral: filme ‘A Gabriela’ e vários documentários; Vermelho: Gabriela Mistral, para ler à noite, perder o sono e ter pesadelos; Blog Oficial: Gabriela Mistral; Memória Chilena: Gabriela Mistral: A Cien Años de su Nascimiento; Chile para Niños: Gabriela Mistral - Vida y Pensamiento; Repositório Unicamp: Gabriela Mistral: das danças de roda de uma professora consulesa no Brasil; Poemas del Alma: Poemas de Gabriela Mistral; wlu.edu: Gabriela Mistral; My poetic Side: Gabriela Mistral Poems; Via Negativa: Mapping a different star: five poems by Gabriela Mistral; Numéro Cinq: Gabriela Mistral: The Archangel, The Wind; Kate Sharpley Library: Chilean Poet Gabriela Mistral and Anarchism.

Ruth Sylvia de Miranda Salles (14.03.1928) é escritora, dramaturga e tradutora brasileira. Ruth Sylvia é autora de poesia: Pastoral (1954); Parcéis (1961); Sem Símbolos Nenhuns (1982); A Criação (1982); As Quatro Árvores (1982); Aprendendo com Poesia (2003); As Aventuras da Gotinha d’Água (História em versos baseada no conto de Walther Pollatschek, 2014); de prosa: Vamos, Maninha, Vamos (memórias de infância, 2008); O Telefone está só regando as Plantas, e outras crônicas/memórias (2010); Do Mulungu ao Manacá - conversando sobre a flora do Brasil (2016); de teatro: Teatro na Escola (64 peças de teatro infantojuvenil, distribuídas em cinco volumes, 2007); de tradução: Gabriela Mistral e Cecília Meireles (tradução de 32 poemas de Gabriela Mistral, 2003); Lendas da Infância de Jesus - de Jakob Streit (2006); A Vinda da Família Real Portuguesa para o Brasil - de Thomas O’Neil (tradução do diário de bordo do tenente fuzileiro inglês, 2007); Os Seis Exercícios Complementares – e o Coração Etérico, de Rudolf Steiner (2008); A desejada Fé - de Joaquim Nabuco (escrito em francês, 2010). Foi agraciada com o Prêmio Club de Poesia (Jocs Florals de la Lengua Catalana), dividido com João Cabral de Melo Neto, pela Antologia de traduções para o português de poemas catalães (1954); Prêmio Olavo Bilac (SEEC do Estado da Guanabara), dividido com Walmir Ayala, pelo livro de poemas Parcéis (1960); Prêmio de Poesia “Governador do Estado” (Comissão Estadual de Literatura - Conselho Estadual de Cultura de São Paulo, 1961), pelo livro Parcéis (1961). Para saber mais: Arte Social: Curriculum de Ruth Sylvia de Miranda Salles; Academia Brasileira de Letras: Revista Brasileira nº 40.

terça-feira, 21 de agosto de 2018

Gabriela Mistral: A Terra


A escritora chilena Gabriela Mistral foi a primeira autora latino-americana a ganhar o Prêmio Nobel de Literatura, em 1945. Os escritores só começaram a compor a lista vinte e dois anos depois, com o guatemalteco Miguel Ángel Asturias (1899-1974), em 1967; o chileno Pablo Neruda (1904-1973), em 1971, o colombiano Gabriel García Márquez (1927-2014), em 1982; o mexicano Octavio Paz (1914-1998), em 1990; o peruano Mario Vargas Llosa (1966), em 2010. Diplomata, feminista e pedagoga, Gabriela Mistral (1889-1957), cujo retrato ilustra a nota de cinco mil pesos chilenos, é dona de uma poesia pungente (mas sem perder o lirismo ao falar de amor e ou de dor) e de uma prosa incômoda e reflexiva (ao abordar temas relacionados à educação e ao papel da mulher e do índio na sociedade, principalmente na América Latina). Há um bom material, na internet, sobre a autora do premiado Sonetos de La Muerte, Tala e Desolación..., veja alguns links na sua biografia abaixo.

Para esta breve homenagem a Gabriela Mistral selecionei quatro poemas, que serão publicados (um a cada dia) ao longo da semana, no original espanhol e em tradução para o português. Comecei com Medo, e sigo com La Tierra..., ou A Terra, em tradução de José Jeronymo Rivera, presente em Poemas escolhidos de Gabriela Mistral (Delta, 1969).


                 

LA TIERRA
Gabriela Mistral

Niño indio, si estás cansado,
tú te acuestas sobre la Tierra,
y lo mismo si estás alegre,
hijo mío, juega con ella...

Se oyen cosas maravillosas
al tambor indio de la Tierra:
se oye el fuego que sube y baja
buscando el cielo, y no sosiega.
Rueda y rueda, se oyen los ríos
en cascadas que no se cuentan.
Se oye mugir los animales;
se oye el hacha comer la selva.
Se oyen sonar telares indios.
Se oyen trillas, se oyen fiestas.

Donde el indio lo está llamando,
el tambor indio le contesta,
y tañe cerca y tañe lejos,
como el que huye y que regresa...

Todo lo toma, todo lo carga
el lomo santo de la Tierra:
lo que camina, lo que duerme,
lo que retoza y lo que pena;
y lleva vivos y muertos
el tambor indio de la Tierra.

Cuando muera, no llores, hijo:
pecho a pecho ponte con ella
y si sujetas los alientos
como que todo o nada fueras,
tú escucharás subir su brazo
que me tenía y que me entrega
a la madre que estaba rota
tú la verás volver entera.



A TERRA
Gabriela Mistral
Tradução: José Jeronymo Rivera

Indiozinho, se estás cansado
Tu te recostas sobre a Terra,
fazes igual se estás alegre,
vai, filho meu, brinca com ela...

Que de coisas maravilhosas
soa o tambor índio da Terra:
se ouve o fogo que sobe e desce
buscando o céu, e não sossega.
Roda e roda, se ouvem os rios
em cascatas que não se contam.
Se ouve mugir os animais;
comer o machado a selva.
Ouve-se soar teares índios.
Se ouvem trilhos e se ouvem festas.

Aonde o índio está chamando,
o tambor índio lhe contesta,
e tange perto e tange longe,
como o que foge e que regressa...

Tudo toma, tudo carrega
o corpo sagrado da Terra:
o que caminha, o que adormece,
o que se diverte e o que pena;
os vivos e também os mortos
leva o tambor índio da Terra.

Quando eu morrer, não chores, filho:
peito a peito junta-te a ela
e se dominas o teu fôlego
como quem tudo ou nada seja,
tu ouvirás subir seu braço
que me jungia e que me entrega
e a mãe que estava quebrantada
tu a verás tornar inteira.

*ilustração: Joba Tridente.2018


Gabriela Mistral (nasceu Lucila de María del Perpetuo Socorro Godoy Alcayaga em Vicuña/Chile: 07.04.1889 e morreu em Nova York/EUA: 10.01.1957) foi educadora, diplomata, feminista e escritora agraciada com o Nobel de Literatura de 1945. O pseudônimo Gabriela Mistral, em homenagem aos poetas Gabriele D’Annunzio (italiano) e Frédéric Mistral (francês), nasceu em 1914, ao ganhar o Concurso de Poesia Juegos Florais de Santiago com Sonetos de La Muerte. Em 1922 publicou seu primeiro livro de poesias, Desolación, ano em que foi convidada pelo Ministério da Educação do México a trabalhar nos Planos de Reforma Educacional, tornando-se referência em pedagogia. Gabriela foi Secretária do Instituto de Coperación Intelectual de la Sociedade de Naciones e Consulesa do Chile e também redatora da revista El Tiempo, de Bogotá e escreveu para o Jornal do Brasil. Viajou pela Europa, Estados e América Latina representando seu país e ou orientando conferências culturais. Seus poemas são pungentes e tematizam tanto o amor quanto a dor. A sua bibliografia traz os seguintes títulos: Desolación (1922); Lectura para mujeres (1924); Ternura (1924); Tala (1938); Lagar (1954); Recados contando a Chile (1957); Páginas en prosa (1962); Los motivos de San Francisco (1965); Poema de Chile (1967); Cartas de amor de GM (1978); Materias (1978); Gabriela piensa en...Santiago de Chile (1978); Prosa religiosa de GM (1978); GM en el "Repertorio Americano" (1978); Gabriela anda por el mundo (1978); Grandeza de los ofícios (1978); Croquis mexicanos (1979); Magisterio y niño (1979); Elogios de las cosas de la tierra (1979); Magistério y Niño (1982); Epistolario de G M y Eduardo Barrios (1988); G M y Joaquín García Monge (1989); Vendré olvidada o amada (1989); Italia caminada (1989); Poesías completas (1989); Memorias y correspondencia con G M y Jacques Marit (1989); Lagar II (1991); En batalla de sencillez (1993); Vuestra Gabriela (1995); Epistolario de G M e Isolina Barraza (1995); Dolor (2001). Para saber mais: Templo Cultural Delfos: Gabriela Mistral - uma viagem pela linguagem poética; Cultura UNAM: Gabriela Mistral – Poesia Moderna; Blog da Inês Büschel:  Gabriela Mistral - Prêmio Nobel de Literatura ; Poetry Foundation: Gabriela Mistral; Antonio Miranda: Gabriela Mistral;  PGL.gal: Gabriela Mistral: filme ‘A Gabriela’ e vários documentários; Vermelho: Gabriela Mistral, para ler à noite, perder o sono e ter pesadelos; Blog Oficial: Gabriela Mistral; Memória Chilena: Gabriela Mistral: A Cien Años de su Nascimiento; Chile para Niños: Gabriela Mistral - Vida y Pensamiento; Repositório Unicamp: Gabriela Mistral: das danças de roda de uma professora consulesa no Brasil; Poemas del Alma: Poemas de Gabriela Mistral;

José Jeronymo (Ribeiro) Rivera (Rio de Janeiro/RJ: 12.6.1933) é escritor e tradutor. Como autor e organizador publicou, na coleção Livro na Rua, da Thesaurus Editora, as seguintes obras: Aprendizado de Poesia (2004); Humberto de Campos: Poesia (2004); Xavier Placer: Poemas (2006); Miguel Torga: Contos (2006); Almeida Garrett: Poesias (2006). Jeronymo Rivera também está presente nas antologias: Alma Gentil (1994), Caliandra: Poesia em Brasília (1995); Antologia de Haicais Brasileiros (2003); Vozes na Paisagem (2005). Traduziu: Poesia Francesa: Pequena Antologia Bilíngue (1998 e 2005); Cidades Tentaculares, de Émile Verhaeren (1999); Rimas, de Gustavo Adolfo Bécquer (2001); Gaspard de la Nuit, de Aloysius Bertrand (2003). Traduziu em parcerias: Poetas do Século de Ouro Espanhol (2000); Victor Hugo: Dois Séculos de Poesia e O Sátiro e Outros Poemas (2002); Antologia Poética Ibero-Americana (2006); Poetas Portugueses y Brasileños - de los Simbolistas a los Modernistas (tradução do português para o  espanhol, publicada pela Embaixada de Portugal na Argentina/Instituto Camões em 2002); Antologia Pessoal, de Rodolfo Alonso (2003). Recebeu os prêmios Joaquim Norberto de Tradução (2001, da União Brasileira de Escritores do Rio de janeiro), por Poetas do Século de Ouro Espanhol, e o prêmio Cecília Meireles de Tradução (2002, UBE-RJ), por Rimas, de Gustavo Adolfo Bécquer. Foi colaborador da Revista de Poesia e Crítica (São Paulo); Revista da Academia Brasiliense de Letras (Brasília); Boletim da Associação Nacional de Escritores (Brasília). Para saber mais: Antonio Miranda: José Jeronymo Rivera; Miscelânea: Revista de Literatura e Vida Social: Entrevista com José Jeronymo Tivera; Academia Leopoldinense de Letras e Artes: José Jeronymo Tivera: poeta e tradutor.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...