quinta-feira, 3 de maio de 2018

Frederic Manning: Os Canhões


Há autores, cuja obra, ainda que pertinente desde o seu lançamento, leva anos para ser assimilada pela crítica e leitores, como a do escritor australiano Frederic Manning, que hoje ganha espaço o Falas ao Acaso, com o perturbador poema OS CANHÕES (1917), na bela tradução (sem compromisso) do escritor Marcílio Farias, que nos ilumina: “Os Canhões é a tradução livre de “Cannons”, apud Scenes and Portraits, Peter Davies Publishing/London, 1930. Frederic Manning (1882-1935) é o Poeta mais importante da Austrália. Serviu no Exercito Australiano durante a Primeira Guerra, tema constante em sua poesia. Punido varias vezes por indisciplina, Manning foi para a reserva em 1918. Criticado pelos seus pares, ostracizado pela sociedade australiana pelos seus hábitos "boêmios", preferencias sexuais, e temperamento, Manning mudou-se para a Inglaterra onde morreu em Hampstead, no ano de 1935. Escreveu quatro livros de poemas, duas novelas, e uma peça teatral. Para Hemingway, Pound, T.E. Lawrence, e T.S.Eliot, Manning é uma das vozes mais expressivas da Poesia do século XX.” New Orleans, Dezembro de 2017.


                             

OS CANHÕES
Frederic Manning
tradução: Marcílio Farias

Ameaça oculta mexe o ar dessa noite, quase:
O trovão lateja, racha e cauteriza
Com centelhas vermelhas e fragmentos incontáveis,
E de repente, contra a pele, a bala perto, quase;
E um gemido vira lamento
De Predador que não arrebatou a presa,
Mais uma vez, quase.
Entre o estrondo desses dos canhões
Sim, lá dentro, cá dentro,
Habitamos um silencio que todas as almas
Cultivam em calmaria
Vestidas em mudez
Sem uma gota de medo.
Mas não se iludam: esse ar histérico e torcido
Treme sob a força dos novos anjos guerreiros
Com suas faces belas e medonhas
(anjos sempre são belos e medonhos);
E nossas almas silenciam, sabendo que
Essas formas terríveis
Sobrecarregam a noite com máxima opressão,
Mas não passam de criaturas paridas por
Vontades constrangidas.

*
ilustração: foto e arte de joba tridente.2018


Frederic Manning (Sydney, Austrália: 22.07.1882 - Hampstead, Reino Unido: 22.02.1935) foi um escritor (extremamente perfeccionista) e humanista australiano. Inquieto, em conflito com o catolicismo e o agnosticismo e incansável na busca da palavra exata para se expressar, Manning é autor de poucas obras, mas todas relevantes. The Middle Parts of Fortune (Soldados Rasos, no Brasil), publicado com o pseudônimo “Private 19022”, em 1929, é considerado o melhor e mais contundente romance de guerra inglês. Em sua bibliografia se destacam: The Vigil of Brunhild: a narrative poem (1907); Frederic Manning: Scenes and Portraits (1909); Frederic Manning: Poems (1910); Frederic Manning: Eidola (1917); Frederic Manning: The Life of Sir William White (1923). Para saber mais da vida e obra deste intenso escritor australiano, recomendo: The Imaginative Conservative: Frederic Manning’s “Her Privates We”: A Mystery of the Great War; John Francis Swain (Tese):  Frederic Manning: A Critical and Historical Analysis; Inside Story: An outsider at war; Poetas Siglo XXI: Frederic Manning; Discover – War Poets: Frederic Manning; PoemHunter: Frederic Manning; Australian Dictionary of Biography: Manning, Frederic (1882–1935); Wikipedia: Frederic Manning.

Marcílio Farias é formado e pós-graduado pela UnB (Universidade de Brasília) em Jornalismo, Cinema e Filosofia. Em 1989 emigrou para os Estados Unidos. Vive e trabalha entre Natal (Brasil) e Phoenix-Miami-Boston (EUA). Obras publicadas/poesia: Visual Field (1996), Watermark Press, MD, EUA; O Livro Cor de Triângulo Cor-de-Rosa (2007), e Rito para Ressuscitar um Elefante (2010), ambos pela Scortecci Editora, São Paulo, Brasil. Links de Marcílio FariaCurrículo completo. Poemas: Moebius; Mandala; Passado incômodo; (John); Diálogo visto de longe na Praça de Sé.



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