Pablo
Neruda nasceu há 110 anos e morreu há 41. Em sua homenagem, o
belíssimo A Grande Alegria, do Canto XV - Eu Sou, publicado no livro Canto Geral, em tradução de Paulo Mendes
Campos para a edição brasileira do Círculo do Livro..., e em espanhol.
XX
A
Grande Alegria
A
sombra que indaguei já não me pertence.
Eu
tenho a alegria duradoura do mastro,
a
herança dos bosques, o vento do caminho
e um
dia decidido sob a luz terrestre.
Não
escrevo para que outros livros me aprisionem,
nem
para encarniçados aprendizes de lírio,
mas
para singelos habitantes que pedem
água e
lua, elementos da ordem imutável,
escolas,
pão e vinho, guitarras e ferramentas.
Escrevo
para o povo ainda que ele não possa
ler a
minha poesia com seus olhos rurais.
Virá o
instante em que uma linha, a aragem
que
removeu a minha vida, chegará aos seus ouvidos,
então o
labrego levantará os olhos,
o
mineiro sorrirá quebrando pedras,
o
caldeireiro limpará a fronte,
o
pescador verá melhor o brilho
dum
peixe que palpitando lhe queimará as mãos,
o
mecânico, limpo, recém-lavado, cheio
do
aroma do sabão, olhará meus poemas,
e
talvez eles dirão: “Foi um camarada”.
Isso é
bastante, essa é a coroa que quero.
Quero
que à saída da fábrica e das minas
esteja
a minha poesia aderida à terra,
ao ar,
à vitória do homem maltratado.
Quero
que um jovem ache na dureza
que
construí, com lentidão e com metais,
como
uma caixa, abrindo-a, cara a cara, a vida,
e
afundando a alma toque as rajadas que fizeram
minha
alegria, na altura tempestuosa.
XX
La
Gran Alegría
La
sombra que indagué ya no me pertenece.
Yo
tengo la alegría duradera del mástil,
la
herencia de los bosques, el viento del camino
y un
día decidido bajo la luz terrestre.
No
escribo para que otros libros me aprisionen
ni para
encarnizados aprendices de lirio,
sino
para sencillos habitantes que piden
agua y luna,
elementos del orden inmutable,
escuelas,
pan y vino, guitarras y herramientas.
Escribo para el pueblo aunque no pueda
leer mi poesía con sus ovos rurales.
Vendrá el instante en que una línea, el aire
que removió mi vida, llegará a sus orejas,
y entonces el labriego levantará los ojos,
el minero sonreirá rompiendo piedras,
el palanquero se limpiará la frente,
el pescador verá mejor el brillo
de un pez que palpitando le quemará las manos,
el mecánico, limpio, recién lavado, lleno
de aroma de jabón mirará mis poemas,
y ellos dirán tal vez: «Fue un camarada.»
Eso es bastante, ésa es la corona que quiero.
Quiero
que a la salida de fábricas y minas
esté mi
poesía adherida a la tierra,al aire,
a la
victoria del hombre maltratado.
Quiero
que un joven halle en la dureza
que
construí, con lentitud y con metales,
como
una caja, abriéndola, cara a cara, la vida,
y
hundiendo el alma toque las ráfagas que hicieron
mi
alegría, en la altura tempestuosa.
*
ilustração
de Joba Tridente - 2014
Pablo Neruda (Parral, 12.07.1904 - Santiago,
23.09.1973). O mais importante escritor chileno nasceu Neftalí Ricardo Reyes
Basoalto. O pseudônimo e posteriormente seu nome legal foi adotado na
adolescência, em homenagem ao escritor tcheco Jan Neruda. Seus primeiros poemas
foram publicados no jornal A Manhã,
de Temuco. Neruda estudou pedagogia e iniciou na carreira diplomática em 1927. Publicou
Crepuculário em 1923 e Vinte poemas de amor e uma canção
desesperada em 1924. Da sua vasta obra destacam-se também: Canto Geral (1950); Cem Sonetos de Amor (1959) e o póstumo Confesso Que Vivi (1974).
Paulo Mendes Campos (1922 – 1991), escritor, tradutor, jornalista e cronista de Correio da Manhã, O Jornal, Diário Carioca, Manchete. Entre outros, traduziu Júlio Verne, Oscar Wilde, John Ruskin, Shakespeare, Pablo Neruda. Seu primeiro livro de poesia, A Palavra Escrita, foi lançado em 1951 e o primeiro de crônicas, O Cego de Ipanema, em 1960.
Paulo Mendes Campos (1922 – 1991), escritor, tradutor, jornalista e cronista de Correio da Manhã, O Jornal, Diário Carioca, Manchete. Entre outros, traduziu Júlio Verne, Oscar Wilde, John Ruskin, Shakespeare, Pablo Neruda. Seu primeiro livro de poesia, A Palavra Escrita, foi lançado em 1951 e o primeiro de crônicas, O Cego de Ipanema, em 1960.
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