Já comentei anteriormente que conheci os poemas do
mestre Thomas Merton a partir das
excelentes traduções livres do escritor e tradutor brasileiro Marcílio Farias que são distribuídas apenas
para seus amigos no FB. Porém, diante de tão bela obra, não tenho resistido e,
sempre que possível, publico algo deles por aqui (confira nos links abaixo).
Macarius e o
Pônei (Macarius and the Pony) é
um poema fascinante..., uma joia que a cada (re)leitura brilha ainda mais. Segundo
o tradutor Marcílio Farias: “Esta é uma
tradução livre de Macarius and the pony, publicado em 1962 na coletânea The Original Child Bomb, que Merton escreveu depois de sua primeira
viagem ao Oriente. O Poema é baseado nas crônicas de Rufinus de Aquileia (345-411),
o asceta romano acusado pelo Vaticano de heresia por defender as teorias de
Pelágio e Origenes, dois autores que Merton estudou profundamente nos seus
primeiros anos no mosteiro cisterciense, onde viveu, no Kentucky. New Orleans,
Novembro de 2017.”
Macarius e o Pônei
Thomas Merton
tradução de Marcílio Farias
Era uma vez..., moradores de
uma vila na margem do deserto
tinham uma filha transformada
(assim pensavam)
uma vila na margem do deserto
tinham uma filha transformada
(assim pensavam)
em um pônei pelas artes de
um homem feiticeiro
(pelo menos era isso o
que pensavam)
(pelo menos era isso o
que pensavam)
E no principio suas línguas não
poupavam
malicia nem veneno e castigavam:
"porque você tinha de aceitar
a forma do cavalo, a forma de uma égua?"
(Ela, em silencio, mergulhava seus
olhos nas águas do deserto)
malicia nem veneno e castigavam:
"porque você tinha de aceitar
a forma do cavalo, a forma de uma égua?"
(Ela, em silencio, mergulhava seus
olhos nas águas do deserto)
Um dia então, com arreio estribo e
tudo o mais levaram a égua para
o meio do deserto quente e seco onde
um eremita chamado
Macarius residia
tudo o mais levaram a égua para
o meio do deserto quente e seco onde
um eremita chamado
Macarius residia
"Mestre", disseram ao
chegar,
"Essa jovem égua aqui na
sua frente, um dia foi ou inda é
o que se chama nossa filha.
Os inimigos, homens sem
caráter, donos de almas feiticeiras,
dela fizeram o animal que
você vê aqui de arreio e estribo. Mas
nós sabemos que suas palavras são
espelho das vozes de um deus e
podem reverter o sortilégio
trazendo de volta a nossa filha ao
estado feliz em que existia."
"Essa jovem égua aqui na
sua frente, um dia foi ou inda é
o que se chama nossa filha.
Os inimigos, homens sem
caráter, donos de almas feiticeiras,
dela fizeram o animal que
você vê aqui de arreio e estribo. Mas
nós sabemos que suas palavras são
espelho das vozes de um deus e
podem reverter o sortilégio
trazendo de volta a nossa filha ao
estado feliz em que existia."
"Oração minha", Macarius
disse,
"Mudará coisa nenhuma,
pois não vejo um animal na minha frente."
(E levou os pais e a menina à sua tenda e
lá falou palavras refletindo
as vozes do deus e ungiu a criança com
óleo de oliveira. E quando os pais
da menina viram o Amor com que
sua mão ungiu o cabelo da criança
entenderam na hora - raio e
trovão - que ela jamais se
transformara, e que sempre tinha sido
e era o que é, uma garota.)
"Mudará coisa nenhuma,
pois não vejo um animal na minha frente."
(E levou os pais e a menina à sua tenda e
lá falou palavras refletindo
as vozes do deus e ungiu a criança com
óleo de oliveira. E quando os pais
da menina viram o Amor com que
sua mão ungiu o cabelo da criança
entenderam na hora - raio e
trovão - que ela jamais se
transformara, e que sempre tinha sido
e era o que é, uma garota.)
"Os olhos de vocês"
(falou Macarius)
"é que são o inimigo e a cegueira"
"Os pensamentos de vocês
(disse o eremita)
são tortos e obtusos e
transformam todos aqueles
que os escutam em
aves de rapina e bestas enlouquecidas;
suas vontades sem-honra
(disse aquele que Enxergava)
transformam os povos do
mundo em fantasmas e cadáveres.
(falou Macarius)
"é que são o inimigo e a cegueira"
"Os pensamentos de vocês
(disse o eremita)
são tortos e obtusos e
transformam todos aqueles
que os escutam em
aves de rapina e bestas enlouquecidas;
suas vontades sem-honra
(disse aquele que Enxergava)
transformam os povos do
mundo em fantasmas e cadáveres.
Macarius and the Pony
Thomas Merton
People in a
village
At the
desert's edge
Had a
daughter
Who was
changed (they thought)
By magic arts
Into a pony.
At first they berated her
"Why do
you have to be a horse?"
She could think of no reply.
So they led her out with a
halter
Into the hot
waste land
Where there
was a saint
Called
Macarius
Living in a cell.
"Father" they said
"This
young mare here
Is, or was,
our daughter.
Enemies,
wicked men,
Magicians,
have made her
The animal
you see.
Now by your
prayers to God
Change her back
Into the girl she used to
be."
"My prayers" said
Macarius,
"Will
change nothing,
For I see no
mare.
Why do you
call this good child
An animal?"
But he led her into his cell
With her
parents:
There he
spoke to God
Anointing the
girl with oil;
And when they
saw with what love
He placed his
hand upon her head
They
realized, at once.
She was no
animal.
She had never
changed.
She had been a girl from the
beginning.
"Your own eyes
(said
Macarius)
Are your
enemies.
Your own
crooked thoughts
(said the
anchorite)
Change people
around you
Into birds
and animals.
Your own
ill-will
(said the
clear-eyed one)
Peoples the
world with specters."
*
ilustração de Joba Tridente.2018
Thomas Merton (1915-1968), escritor e monge
trapista da Abadia de Getsêmani, Kentuchy, foi ativista social, pacifista e
estudioso de religiões comparadas. Escreveu mais de setenta livros de prosa e
verso, a maioria sobre espiritualidade. Em 1944 publicou Thirty Poems. O segundo livro, A
Man in the Divided Sea, foi lançado em 1946. Entre suas
obras de grande repercussão se destacam The
Seven Storey Mountain (1948); No Man
Is An Island (1955); The Way of
Chuang Tzu (1965). Fontes:
Wikipédia e Thomas Merton Center. Links de Thomas Merton: 05.12.2015: Thomas
Merton: Paisagem com Criança; 28.04.2016: Thomas Merton: Primeira lição
sobre o homem;
29.04.2016: Thomas
Merton: Três Epigramas; 30.04.2016: Thomas
Merton: Desalentados e Criminosos; 01.05.2016: Thomas
Merton: A Queda; 02.05.2016: Thomas
Merton: Deus é Bom; 02.07.2016: Thomas
Merton: Para Fazer Krishna Dormir
Marcílio Farias é formado e pós-graduado pela
UnB (Universidade de Brasília) em Jornalismo, Cinema e Filosofia. Em 1989
emigrou para os Estados Unidos. Vive e trabalha entre Natal (Brasil) e
Phoenix-Miami-Boston (EUA). Obras publicadas/poesia: Visual Field (1996), Watermark
Press, MD, EUA; O Livro Cor de
Triângulo Cor-de-Rosa (2007), e Rito para Ressuscitar um Elefante (2010), ambos pela Scortecci
Editora, São Paulo, Brasil. Links de
Marcílio Faria: Currículo
completo. Poemas: Moebius;
Mandala;
Passado
incômodo; (John);
Diálogo
visto de longe na Praça de Sé
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