No dia 23 de janeiro de 2018 o antipoeta chileno Nicanor
Parra fez a sua antipassagem espiritual para o antimundo e, em sua
memória, o Falas ao Acaso abre um pós-espaço para mais uma vez homenageá-lo. Em
2015, em aplauso aos seus 101 anos, publiquei Dos Chistes;
Se Canta Al Mar; Autorretrato; Cartas A Una Desconocida e Epitáfio, presentes
na antologia digital bilíngue Nicanor Parra e Vinícius de Moraes (2009), com tradução e introdução de Carlos Nejar e
Maximino Fernández, disponibilizada pela Academia Brasileira de Letras e a Academia
Chilena de la Lengua.
Nesta
nova série você acompanha a postagem de cinco antipoemas de Nicanor Parra, em
espanhol e em traduções de Carlos Nejar e de João Carlos Martins. Ontem você conheceu
o Solo de Piano e leu um trecho do
perfil do escritor chileno..., hoje fica com Desordem no Céu (Desordien en
el Cielo), do livro Poemas e
Antipoemas (1954), em tradução de João Carlos Martins para a edição digital
NicanorParra - Poemas e antipoemas (2014), disponibilizada pela kza1/editora
livre.
DESORDEN
EN EL CIELO
Nicanor Parra
Un cura sin saber
cómo
Llegó a las puertas
del cielo,
Tocó la aldaba de
bronce,
A abrirle vino San
Pedro:
"Si no me dejas
entrar
Te corto los
crisantemos".
Con voz respondióle
el santo
Que se parecía al
trueno:
"Retírate de mi
vista
Caballo de mal
agüero,
Cristo Jesús no se
compra
Con.mandas ni con
dinero
Y no se llega a sus
pies
Con dichos de
marinero.
Aquí no se necesita
Del brillo de tu
esqueleto
Para amenizar el
baile
De Dios y de sus
adeptos.
Viviste entre los
humanos
Del miedo de los
enfermos
Vendiendo medallas
falsas
Y cruces de
cementerio.
Mientras los demás
mordían
Un mísero pan de
afrecho
Tú te llenabas la
panza
De carne y de huevos
frescos.
La araña de la
lujuria
Se multiplicó en tu
cuerpo
Paraguas chorreando
sangre
¡Murciélago del
infierno!"
Después resonó un
portazo,
Un ray o iluminó el
cielo,
Temblaron los
corredores
Y el ánima sin
respeto
Del fraile rodó de
espaldas
Al hoyo de los
infiernos.
DESORDEM
NO CÉU
Nicanor Parra
tradução: João Carlos Martins
Um padre sem saber
como
Chegou às portas do
céu,
Bateu a campainha
de bronze,
E ao abrir viu São
Pedro:
“Se não me deixa
entrar
Te corto os
crisântemos”.
Com voz respondeu o
santo
Que se sentava ao
trono:
“Se retire da minha
frente
Cavalo de mau
auspício,
Jesus Cristo não se
compra
Com mandado, nem
com dinheiro
E não chega aos
seus pés
Com falas de
marinheiro.
Aqui não se precisa
Do brilho de teu
esqueleto
Para melhorar a
dança
De Deus e seus
adeptos.
Você viveu entre os
humanos
Do medo dos doentes
Vendendo medalhas
falsas
E cruzes de
cemitério
Enquanto os demais
mordiam
Um mísero pão
sovado
Você enchia a pança
De carne e ovos
frescos.
A aranha da luxúria
Se multiplicou em
seu corpo.
Guarda-chuva
pingando sangue
Morcego dos
infernos!”
Depois ressoou uma
batida de porta
Um raio iluminou o
céu,
Os corredores
tremeram
E o espírito sem
respeito
Do frade virou de
costas
E deu direto no
olho dos infernos.
*
ilustração de Joba Tridente.2018
Nicanor Parra (San
Fabián de Alico, Chile em 5 de setembro de 1914 - La Reina, Chile em 23 de
janeiro de 2018). Formou-se em Matemática e Física no Instituto Pedagógico da
Universidade do Chile. Estudou Mecânica avançada na Universidade de Brown,
Rhode Island (1943-1945). Foi diretor interino da Escola de Engenharia da
Universidade do Chile, discípulo do Cosmólogo E.A. Miner em Oxford e professor
de Mecânica Teórica na Universidade do Chile. Nicanor Parra tinha grande
afinidade com as obras de Federico Garcia Lorca e Walt Whitman e os seus
antipoemas teriam sido influenciados por filmes de Charles Chaplin, e o
surrealismo de autores como Franz Kafka, Thomas Stearns Eliot, Ezra Pound, John
Donne e William Blake. O escritor chileno, que recebeu, em 2011, o Prêmio
Cervantes, oferecido pelo Ministério da Cultura da Espanha, estreou
na literatura com Cancioneiro sem Nome (1937).
A publicação da obra que o consagrou deu-se em 1954, Poemas
y Antipoemas. Em seguida vieram: La
cueca larga (1958) e Versos
de Salón (1962), Manifiesto (1963), Canciones rusas (1967), Obra
gruesa (1969), Los professores (1971),
Artefactos (1972), Sermones y prédicas del Cristo de Elqui
(1977), Nuevos sermones y prédicas del
Cristo de Elqui (1979), El anti-Lázaro
(1981), Plaza Sésamo (1981), Poema y antipoema de Eduardo Frei (1982),
Cachureos, ecopoemas, guatapiques,
últimas prédicas (1983), Chistes para
desorientar a la policía (1983), Coplas
de Navidad (1983), Poesía política
(1983), Hojas de Parra (1985), Poemas para combatir la calvície (1993),
Páginas en blanco (2001), Lear Rey & Mendigo (2004), Obras completas I & algo + (2006), Discursos de Sobremesa (2006), Antiprosa
(2015). Fontes: Wikipedia e Antologia de Nicanor
Parra e Vinicius de Moraes - ABL/ACL.
Nota: O Portal
da Universidad de Chile disponibiliza a obra de Nicanor Parra e de
outros grandes nomes em Retablo de Literatura Chilena.
João Carlos Martins (?). Não encontrei informação alguma sobre o tradutor, nem no site da
editora kza1. Não sei se é homônimo do pianista e maestro brasileiro e ou se o
próprio.
Maravilhoso poema!!!Salve, Salve o Parra!
ResponderExcluir..., Salve! Salve!
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