quarta-feira, 4 de junho de 2014

Raul Bopp: Mãe-Preta

Raul Bopp, um dos mais importantes nomes da Semana de Arte Moderna (1922) morreu em 1 de Junho de 1984. A sua literatura impressiona pela contemporaneidade. A obra-prima Mãe-Preta está em Urucungo - poemas negros, de 1932. A Antologia da Moderna Poesia Brasileira - Revista Acadêmica, 1939, em edição da Brasiliana Digital-USP, assim apresenta o mestre que, segundo Oswald de Andrade, traz a poesia nos dentes:

“Raul Bopp nasceu em Tupaceretan, no Estado do Rio Grande do Sul. Formou-se em advocacia fazendo um ano em quase todas as Faculdades de Direito do Brasil. Esse Brasil que ele conhece todo, pois o furou de lado a lado, com os jangadeiros do Ceará, pintor de taboletas em Mato Grosso, macumbeiro ao lado de Edison Carneiro na Bahia, companheiro de republica de José Lins do Rego em Pernambuco, chefe do modernismo com Oswald de Andrade em São Paulo, tendo polêmicas literárias no Pará, atravessando todos os igarapés do Amazonas. /  Tornou-se lendário no Nordeste e ainda hoje contam por lá anedotas das quais Raul Bopp é o herói, assim como de outras os heróis são Camões e Bocage. O poeta passou a ser folk-lore. Depois enfiou pelo vasto Universo em várias viagens; empregou todos os meios de condução, visitou a totalidade de países que formam esse mundo de Deus. Para muita gente o poeta ficou sendo Pedro Malazarte reincarnado.”


         

MÃE-PRETA¹
Raul Bopp

- Mãe-preta, me conta uma história
- Então feche os olhos filhinho:

Longe muito longe
era uma vez o rio Congo…

Por toda parte o mato grande
Muito sol batia o chão

De noite
chegavam os elefantes
Então o barulho do mato crescia

Quando o rio ficava brabo
inchava

Brigava com as árvores
Carregava  com tudo, águas abaixo
até chegar na boca do mar

Depois…

Olhos da preta pararam
Acordaram-se as vozes do sangue
glu-glus de água engasgada
naquele dia do nunca-mais

Era uma praia vazia
com riscos brancos de areia
e batelões carregando escravos

Começou então
uma noite muito comprida.
Era um mar que não acabava mais

… depois…

- Ué mãezinha
por que você não conta o resto da história?


*
Ilustração de Joba Tridente - 2014


Raul Bopp (1898-1984): escritor modernista integrante da Semana de Arte Moderna, cronista, jornalista. Autor de Cobra Norato (1931); Urucungo - Poemas Negros (1932); Poesias  (1947);  Antologia Poética (1967); Putirum: Poesias e Coisas do Folclore (1969); Mironga e Outros Poemas (1978). "Bopp Passado a Limpo" por Ele Mesmo (1972); Samburá: Notas de Viagens & Saldos Literários (1973); Vida e Morte da Antropofagia (1977); Longitudes: Crônicas de Viagens (1980). Em outros registros, Raul Bopp teria nascido em Vila Pinhal e ou Santa Maria, no Rio Grande do Sul.

1. Como há versões de Mãe-Preta com pontuação diferenciada e não tenho a original de Urucungo, optei por aquela que se encontra em Raul Bopp - Cobra Norato e Outros Poemas, editado pela Civilização Brasileira em 1975.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...