Conheci Otávio Afonso na década de 1980, em
Brasília-DF. Eu trabalhava no Correio
Braziliense e ele no CNDA - Conselho
Nacional de Direito Autoral. Chegamos a formar, com outros escritores candangos,
um grupo de estudos para discutir literatura, principalmente poesia, e até
fizemos uma homenagem a Luís de Camões, com leitura de poemas, num evento
cultural. Em 1987, convidado por ele, assumi a Chefia da Comunicação Social do
CNDA, onde fiquei até 1990, quando o Conselho foi extinto. Eu me mudei para
Curitiba onde, a convite do escritor e editor Wilson Bueno (1949-2010), fui
Diretor de Arte do Jornal NICOLAU, de
1990 a 1995. Mantive contato com Otávio por mais um tempo..., depois o trabalho
foi nos distanciando e só retomamos o contato em 2007, quando ele me ligou e
conversamos por um longo tempo e soube que estava em tratamento contra um
câncer.
Otávio Afonso foi
uma das maiores autoridades e o mais apaixonado pelo Direito Autoral no Brasil,
deixando, inclusive, uma importante obra póstuma sobre o assunto: Direitos Autorais: Conceitos Essenciais.
Hoje quero lembrar o escritor que, em 1980, recebeu o cobiçado prêmio cubano Casa de Las Américas, com o livro de
poema Cidade Morta. Para
homenageá-lo, selecionei sete belos e melancólicos poemas de seu blog Chão do Adeus. Destes
seus quatro últimos meses de pungente vida literária, escolhi a primeira
postagem: infância (15.10.2007) e a
última: Lição (13.02.2008). Entre
elas: tempo seco (23.10.2007), estrangeiro (9.12.2007), triste carne (28.11.2007), tv-lândia (9.12.2007) e adeus amor (10.01.2008).
DOMINGO,
9 DE DEZEMBRO DE 2007
estrangeiro
este
quarto este espelho
que me fita e a nada me reduz
essa luz que me fere de esguelha
traz em si minhas duras parelhas
espaço onde armo minhas redes
ouço o ranger de elos e dentes
aqui onde a direção se perde
nenhum lugar há que desconheça
este quarto este momento
em que a mão se põe suspensa
e a voz se faz lamento
além do desespero e da face tensa
tenho o fogo do tormento
neste quarto entre tais paredes
onde o corpo se despe por inteiro
sinto a distância fria dos intrusos
como se fosse eu um estrangeiro
que me fita e a nada me reduz
essa luz que me fere de esguelha
traz em si minhas duras parelhas
espaço onde armo minhas redes
ouço o ranger de elos e dentes
aqui onde a direção se perde
nenhum lugar há que desconheça
este quarto este momento
em que a mão se põe suspensa
e a voz se faz lamento
além do desespero e da face tensa
tenho o fogo do tormento
neste quarto entre tais paredes
onde o corpo se despe por inteiro
sinto a distância fria dos intrusos
como se fosse eu um estrangeiro
Postado
por Otávio Afonso às 10:10
*
Ilustração
de Joba Tridente. 2015
Otávio Afonso (1953-2008) nasceu em Porto Velho (RO). O Jornalista e escritor foi o primeiro autor brasileiro a ganhar o prêmio Casa de Las Américas, em Havana/Cuba, em 1980, com o livro de poesias Cidade Morta. Otávio, que é o autor de Imagens, letra que ganhou melodia de Marlui Miranda, gravada por ela no disco Revivência (1983), publicou Sábado 13 horas (1978), poemas experimentais com Damário da Cruz e Márcio Salgado, e participou de várias coletâneas, entre elas a organizada por Hilda Hirst: Novos Poetas Brasileiros. Na web destaco dois sites que registram o seu trabalho, a sua militância, praticamente solitária, pela valorização do autor brasileiro: o observatório do direito à comunicação, que traz o artigo: Otávio Afonso deixa livro como legado em Direitos Autorais; e o Rodrigo Moraes, com uma entrevista surpreendente: Otávio Afonso, publicada em 16.11.2007.
Nenhum comentário:
Postar um comentário