a carta
magna dos ignorantes foi endereçada e lida como manifesto no I encontro dos ignorantes na Cidade da
Paz, em Brasília, em 4 de Julho de 1991, organizado por bene fonteles, pierre weil, tt catalão, romulo pintoandrade e ary pararraios. a publicação original foi no viva alternativa, jornal boletim ecomilitante do espaço cultural jegue elétrico, editado pelo ary...
CARTA MAGNA DOS IGNORANTES
TT
Catalão
Nenhum
ignorante será magno no sentido da
magnitude
soberana.
Na era
da arrogância, assumir sua santa
ignorância
é alimentar que o saber não significa
sobrar
soberba,nem mesmo subir.
É
buscar o sábio, e não o sabido.
Estar
desperto sem se preocupar em ser
esperto.
A santa
ignorância aprende, mas não apreende.
Entende
que a besta é a fera que por si só se
basta, de
si e seus sinais em seu casulo,
cláusulas
de competência específica para
encerrar-se
nos muros da certeza
que
soam ocas como mortalhas.
A
ignorância é radical porque toma as coisas
pela
raiz. Está aberta, apaixona-se pelo
processo,
encanta-se pelo enredo
mas não
se enreda pelo novelo.
Ela
entende que não são as asas que possibilitam o
voo,
mas as tentativas. Quer o movimento irregular dos rios,
e não o
dos pêndulos. Não tem planos nem metas,
mesmo
para a metamorfose.
Faz do
porto um ponto de partida em
permanente
parto, porque celebra a vida.
A
vertigem da ignorância é aceitar o "não sei"
feito
lucidez lúdica para evitar o jogo belicoso do "não-sim".
A
visagem da ignorância é a constante luz além
do
limbo.
Clama:
a diferença nos une.
Proclama:
a diferença nos unge.
Reclama:
a diferença nos fará imunes ao
contágio
totalitário.
Ao
absoluto, o nosso luto.
A
melhor resposta é aquela que provoca novas
dúvidas.
A
insegurança é doce porque abriga inúmeras
descobertas.
A
fraternidade é imprecisa porque o dom da
graça não
tem raça.
O que
ignora, ora, quando procura.
Está
livre para todos os níveis por estar disponível.
Julga,
mas não subjuga.
Usa
bulas, mas não as acumula.
Se
apega apenas como circunstância de
entrega,
mas não se prega.
Quer a
comunhão consigo,
com os
outros e com o meio sem alterar
o
modelo porque atua na medula.
Flutua
sobre o que está demasiadamente
firme,
rijo, cadavericamente incondicional.
Influi
no que não admite contradição, sobre o
que
está umbilicamente atado ao peso de sua
imobilidade.
O que
está seguro está em apuros.
Aos que
vivem sob extremado estado de
garantias,recomenda-se
a fragilidade volúvel e
volátil
da ignorância ativa.Tanta cautela é o elo
da
tutela. Dar um assalto no escuro.
Aos que
temem riscos sugerimos o final do
juízo e
a fuga da narcose embalada pelo narciso.
Dependência
é a morte.
Deus é
grátis, mas guru cobra ingresso.
A
herança do parcial é a apólice da parcela.
Sem
resgate. Dívida eterna.
Pela
ignorância se vê que divagar se vai ao
longo.
O ideal
é começar pelo possível.
O erro
é o melhor professor da rota.
O pleno
não tem rumo, fronteira ou porta.
Todo é
tudo que não se corta.
Arte
não se reparte. Sem enfarte.
O sonho
deixa de ser senha quando não acorda
e se
transporta. Verdade se revela numa hora e
na
outra já é torta.
Às
vezes o frágil é mais ágil para sair do
estreito,
do estrito, do restrito.
Só o
sectário secciona.
O
ignorante confia no desafio.
Quer
mais autores e menos autoridades.
Desdenha
a facção científica.
O que
fraciona é fratricida.
Podemos
reconhecer no desconhecimento uma
aliança
quando a gente decide ser.
Quando
a gente diz "sei", seremos serenos,
leves,
solidários, à espera do contrário, do
contraponto
que rasga, não por mal, mas para
nos
ensinar que nascemos para perder cascas.
A
estupidez precisa de um basta, a ignorância
cria
castas,as feras são as bestas que por si só
se
bastam, mas os ignorantes serão este
improvável
plasma infinito em exercício
permanente
do vir-a-ser para servir.
Contra
o demônio do domínio.
Pois se
é do EU,é cÉU,se é do EGO,é cEGO.
*
Ilustração:
foto e intervenção de Joba Tridente. 2015
TT
Catalão: para conhecer um pouco mais da obra deste escritor
em constante ebulição criativa, acompanhe a publicação de Um
Prólogo e Sete Poesias que fiz, aqui, em Agosto de 2014.
INCRÍVEL COMO AS PALAVRAS FALAM O QUE APENAS SENTIMOS E NÃO SABEMOS REPRODUZIR EM PALAVRAS.
ResponderExcluirFALAR DO SENTIMENTO DE NÃO SABER, AO MESMO TEMPO SENTINDO EXATAMENTE O QUE QUER EXPRESSAR, SEM PRETENSÃO, É UMA ARTE RESERVADA APENAS AOS QUE SE RECONHECEM IGNORANTES, E QUE MESMO ASSIM, SE RECONHECEM APTOS A APRENDER CADA VEZ MAIS.
..., uma questão de observação do mundo e do verbo no mundo, caro Unkmown!
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