O ano de
2018 marca os 110 anos de nascimento de João
Guimarães Rosa (Cordisburgo-MG: 27.06.1908 - Rio de Janeiro-RJ:
19.11.1967), um dos mais renomados escritores brasileiros. Autor de contos
célebres presentes em livros como Sagarana
(1946), Primeiras Histórias (1962), Tutameia (1967) e da obra-prima Grandes Sertões: Veredas (1956), antes
de alcançar a linguagem coloquial sertaneja definitiva e nos deliciar com toda
riqueza do falar regionalista, Guimarães Rosa enveredou pela poesia. Porém,
mesmo premiado pela Academia Brasileira de Letras e com elogios do poeta
Guilherme de Almeida (1890-1969), o seu livro de poema Magma (1936) foi considerado “pouco
convincente” por ele: “O Magma, aqui dentro, reagiu, tomou vida própria,
individualizou-se, libertou-se do meu desamor e fez-se criatura autônoma, com
quem talvez eu já não esteja muito de acordo, mas a quem a vossa consagração me
força a respeitar.” (em discurso de agradecimento ao prêmio, na ABL,
em 1937).
João
Guimarães Rosa não é o primeiro escritor a negar a própria obra. Magma (1936), que só foi publicado
postumamente em 1977, realmente está aquém de suas obras magnas, como Sagarana e Grande Sertões: Veredas. No entanto, embora menor em sua
bibliografia, não é descartável. Há excelentes poemas, entre outros não tão
elaborados..., uma vez que a sua fascinante linguagem ainda não estava polida
de tanta significância: "(...)
escrevi um livro não muito pequeno de poemas, que até foi elogiado. Passaram-se
quase dez anos, até eu poder me dedicar novamente à literatura. E revisando meus
exercícios líricos, não os achei totalmente maus, mas tampouco muito
convincentes."
Aproveitando
a data de 41 anos da primeira edição de Magma,
lançado, pela Editora Nova Fronteira,
41 anos após a sua premiação, selecionei alguns poemas deste livro, para quatro
postagens e um poema bônus, para homenagear este brasileiríssimo escritor João Guimarães Rosa, que nos deixou
precocemente há 51 anos. Ontem você conheceu o Sono das Águas e hoje apreende o sentido das cores Alaranjado, Verde e Amarelo.
Alaranjado
João Guimarães Rosa
João Guimarães Rosa
No campo seco, a crepitar em brasas,
dançam as últimas chamas da queimada,
tão quente, que o sol pende no ocaso,
bicado
pelos sanhaços das nuvens,
para cair, redondo e pesado,
como uma tangerina temporã madura…
dançam as últimas chamas da queimada,
tão quente, que o sol pende no ocaso,
bicado
pelos sanhaços das nuvens,
para cair, redondo e pesado,
como uma tangerina temporã madura…
Verde
João Guimarães Rosa
Na lâmina azinhavrada
desta água estagnada,
entre painéis de musgo
e cortinas de avenca,
bolhas espumejam
como opalas ocas
num veio de turmalina:
é uma rã bailarina,
que ao se ver feia, toda ruguenta,
pulou, raivosa, quebrando o espelho,
e foi direta ao fundo,
reenfeitar, com mimo,
suas roupas de limo…
Amarelo
João Guimarães Rosa
João Guimarães Rosa
Kuang-Ling,
pintor chinês de máscara de cera,
feliz de ópio, e ébrio de dragões,
molha o pincel na água de ocre
do Huang-Ho,
e, entre lanternas de seda,
pinta e repinta,
durante trinta anos,
sulfúreos e asiáticos girassóis,
na incrível porcelana de um jarrão
dos Ming…
pintor chinês de máscara de cera,
feliz de ópio, e ébrio de dragões,
molha o pincel na água de ocre
do Huang-Ho,
e, entre lanternas de seda,
pinta e repinta,
durante trinta anos,
sulfúreos e asiáticos girassóis,
na incrível porcelana de um jarrão
dos Ming…
*
ilustração de Joba Tridente.2018
João Guimarães Rosa (Cordisburgo, MG: 27.06.1908 - Rio
de Janeiro, RJ: 19.11.1967): médico, diplomata, escritor brasileiro. A sua
obra, de forte apelo regional, é ambientada no sertão brasileiro e nos brinda,
linha a linha, com seu delicioso falar, cheio de sotaques e novos vocábulos.
Guimarães Rosa foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, em 16.11.1967,
e deveria ocupar a cadeira 2, de Álvares de Azevedo, não fosse a sua morte três
dias depois, em 16.11.1967. Iniciou a carreira literária em 1929, com a
publicação do conto O mistério de
Highmore Hall, na revista O Cruzeiro.
Dono de uma cultura invejável, com domínio de fala e leitura em várias línguas,
dizia que “Estudar o espírito e o
mecanismo de outras línguas ajuda muito à compreensão mais profunda do idioma
nacional. Principalmente, porém, estudando-se por divertimento, gosto e
distração.” Recebeu os seguintes prêmios: Academia Brasileira de Letras
pelo livro de poesia Magma; Prêmio
Filipe d'Oliveira por Sagarana
(1946); Prêmio Machado de Assis (do Instituto Nacional do Livro), Prêmio Carmen
Dolores Barbosa (1956) e Prêmio Paula Brito (1957) pelo romance Grande sertão: Veredas; Prêmio do PEN
Clube do Brasil (1963), para Primeiras
estórias. Guimarães Rosas é autor de Magma
(1936); Sagarana (1946); Com o Vaqueiro Mariano (1952); Corpo de Baile (1956); Grande Sertão: Veredas (1956); Primeiras Estórias (1962); Manuelzão e Miguilim (1964); Campo Geral (1964); No Urubuquaquá, no Pinhém (1965); Noites do sertão (1965); Tutaméia - Terceiras Estórias
(1967); Estas Estórias (póstumo.
1969); Ave, Palavra (póstumo,
1970); Antes das Primeiras Estórias (póstumo,
2011). Há farto material na internet sobre Guimarães Rosa, portanto, para saber
mais sobre um dos pioneiros do Realismo Fantástico no Brasil, sugiro: Templo
Cultural Delfos: João Guimarães Rosa - o demiurgo do
sertão; Templo
Cultural Delfos: João Guimarães Rosa e o Magma - o
poeta não cita: canta;
Revista Prosa Verso e Arte: João Guimarães Rosa; Academia Brasileira de Letras: João Guimarães Rosa; USP - Banco de Dados Bibliográfico:
João Guimarães Rosa; Instituto Moreira Sales: A João Guimarães Rosa por Maureen
Bisilliat; Folha de
S.Paulo: Memórias do diplomata João Guimarães
Rosa; Revista
Planeta: Centenário de João Guimarães Rosa; Memorial da Democracia: João Guimarães Rosa Reinventa a
Linguagem; SciELO: A biblioteca alemã de João Guimarães
Rosa; Clipping CACD:
Entrevista com Guimarães Rosa; Sílvio José Stessuk: tese: Magma - Breviário de Rosa.
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