Não sou muito ligado a datas. Para mim
todo dia é dia de todo dia e do que e de quem quiser o dia. Como havia
prometido publicar algo da Literatura Africana, achei apropriado aproveitar a Semana da Consciência Negra, para
começar. Assim, a cada dia (até 24 de novembro de 2012) postarei um conto, um
poema...
Serão
Menino
Na noite morna, escura de breu,
enquanto na vasta sanzala do ceu,
de volta das estrelas, quais fogareus,
os anjos escutam parábolas de santos...
na noite de breu,
ao quente da voz
de suas avós,
meninos se encantam
de contos bantus...
"Era uma vez uma corça
dona de cabra sem macho...
... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
... ... ..
... Matreiro, o cágado lento
tuc... tuc... foi entrando
para o conselho animal...
("não tarde que ele chegou!")
Abriu a boca e falou -
deu a sentença final:
"-não tenham medo da força!
Se o leão o alheio retém
-luta ao Mal! Vitória ao Bem!
tire-se ao leão - dê-se à corça."
Mas quando lá fora
o vento irado nas frestas chora
e ramos xuxualha de altas mulembas
e portas bambas batem em massembas
os meninos se apertam de olhos abertos:
- Eué
- É cazumbi...
E a gente grande -
bem perto dali
feijão descascando para o quitende -
a gente grande com gosto ri...
Com gosto ri, porque ela diz
que o cazumbi males só faz
a quem não tem amor, aos mais
seres busca, em negra noite,
essa outra voz de cazumbi
essa outra voz - Felicidade...
*
Viriato Francisco Clemente da Cruz (1928 -
1973) nasceu em Kikuvo, Porto Amboim, e estudou em Luanda. Viriato, cuja
obra tem forte apelo regionalista, foi um dos grandes impulsionadores da poesia
angolana, nas décadas de 1940/1950. Autor engajado e um dos líderes da luta pela
libertação de Angola, a poesia de Viriato
da Cruz está dispersa em várias publicações e, acredita-se completa, em uma
antologia de 1961: Poemas.
Ilustração
de Joba Tridente
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