quinta-feira, 30 de maio de 2013

Literatura Latino-Americana: Jorge Timossi


Certa manhã, há muitos e muitos sábados, encontrei na ponta de estoque de uma livraria de Curitiba o encantador livro Continhos e outras alterações, de Jorge Timossi, com ilustrações de Quino. Uma joia rara. Até onde sei, o único livro do autor lançado no Brasil. A edição é de 1997 e saiu pela Casa Jorge Editorial, com tradução de Sieni Marcia Campos. Após a recente publicação de três Hai-Kais que tratam da passagem do tempo, pensei em postar algo mais lúdico, mais leve, e me lembrei da fascinante obra de Jorge Timossi. Escolhi cinco Continhos. Entre eles, o antológico A Aranha, que já postei anteriormente.



O Peixinho

Nesse domingo, Néstor Brasal foi pescar, feliz e plácido, na famosa lagoa conhecida como As Águas do Olvido, usou como isca um pouco de memória que lhe restava, lançou o anzol e, pouco depois, puxou um peixinho dourado, muito bonito e reluzente, que contemplou durante alguns minutos e, a seguir, tomando precauções para que ninguém visse, devolveu ao seu meio natural, atirando-o com cuidado, mas também com certa dose de nostalgia que lhe durou o resto daquele dia em que, por mais paciência e tenacidade que tivesse, não conseguiu fisgar nada mais, nem sequer uma sardinha de lembrança. (p.67)


Melodrama
para I. Dávila e M. Rojas

Apagou a tela da televisão, olhou ao redor e se convenceu de que o que agora estava vendo era algum outro capítulo mal alinhavado daquela mesma novela. (p.23)


Teoria

O camelo tentou de tudo para passar pelo buraco de uma agulha, mas, quando se convenceu de que era impossível, teve a ideia de contornar um lado dessa maldita agulha e colocar-se, assim, do outro lado, como quem cumpriu da mesma forma aquela sagrada missão de que o haviam encarregado. (p.13)



A Aranha

Ficou tão bonita minha teia que já não desejo que caia em sua fúlgida trama nenhuma outra vítima além de mim mesma. (p.9)


Imigração
para Miguel Barnet

O funcionário da alfândega abriu a maleta de couro gasto, comprovou que aquele imigrante levava apenas sua pesada tragédia pessoal, fechou-a com muito cuidado e murmurou, como se não se referisse a ninguém em particular: “Passe, de qualquer maneira acho que não vai lhe ser de nenhuma utilidade”. (p.53)


*
ilustrações e fotomontagem de Joba Tridente


Jorge Timossi Corbani (Buenos Aires, 1936 - Havana, 2011) - escritor, cronista, ensaista e jornalista argentino-cubano. Correspondente em diversos países, inclusive no Brasil (1959 e 1960), cofundador da Agência Prensa Latina, foi agraciado, entre outros, com o Prêmio da Organização Internacional de Jornalistas (1979); Ordem Félix Varela (1996); Prêmio Nacional de Jornalismo José Martí (1999). Timossi, que inspirou o personagem Felipe, do genial criador de Mafalda, é autor de: Poesia Actual de Buenos Aires (1964); El Desafio Cubano (1968); Grandes Alamedas, el Combate del Presidente Allende (1974); Poemas de un Corresponsal (1981); Palmeras (1982); Um perfume para Lam (1988); Las cosas como son (1991); Cuentecillos y otras alteraciones (1995); Crónicas casi reales (1995); Los consejos del abuelo conejo (1999); Juego de Apariencias (?); Juan Pablo II en Cuba (coautor con el fotógrafo Korda y Jorge Luna (?); Palabras sin fronteras (2001).


No Brasil há pouquíssima informação sobre Jorge Timossi. Vasculhando na web encontrei uma matéria bacana (link): Jorge Timossi em mi memoria, de José dos Santos, para revista de cultura cubana (link) La Jiribilla. Se encontrar Continhos e outras alterações em alguma livraria, compre!..., vale cada palavra.

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