Em Outubro de
2012, na Semana da Criança, postei a fábula O
Cão e o Tamanduá, do Doutor Anastácio Luiz do Bomsucesso, que
encontrei no curioso livro Florilegio Brasileiro da Infancia - editado pela Livraria Clássica do
Editor Nicoláo-Alves, em 1874, e disponibilizado em versão digital pela Brasiliana USP. Em tempos de excesso e
de falta de água, volto ao Florilegio
para postar uma bela Alegoria: O Rio e O Regato, assim definida: “A alegoria é uma poesia solta ou incluída em outra,
na qual, com uma ação fantástica e com sujeitos e objetos de natureza estranha,
se pintam fatos e ações próprias dos homens.” O Rio e O Regato é de autoria de Marquez de Paranaguá. Atualizei rapidamente a grafia.
O RIO E
O REGATO
Marquez
de Paranaguá *
A um manso regato um dia
Soberbo rio dizia:
Desgraçado,
eu te lamento,
Em teu
curso pobre e lento;
Pois
fazendo voltas tantas
Por
entre rasteiras plantas,
Corres
sem nome, escondido,
Entanto
que eu conhecido
Nas
cidades mais formosas,
Minhas
ondas copiosas
Meto,
levando abundância
A mais
remota distancia.
Cem
regatos orgulhosos
De
minha aliança, ansiosos,
Se vêm
meter no meu seio
Sem
fazer um só rodeio.
Demais,
eu tenho coragem,
E nada
em minha passagem
Encontro,
que eu não arrede.
Disse; e ainda mais falara,
Quer da sua origem rara,
Quer das suas qualidades,
Quando a tais fatuidades,
Mais sábio, o pobre regato
Lhe responde, e mui pacato:
Que,
amigo! da matriz
Ou lago
d'onde saís,
Não
tenho eu também saído?
Logo
depois de nascido
Um e
outro n'esta selva,
Debaixo
da mesma relva,
Nossas
águas não correram?
D'onde
é pois, que vos vieram
Tantos
fumos de altivez ?
Só o
acaso é que nos fez,
Deixando
o materno berço,
Correr
por lugar diverso.
Vós em
terreno inclinado
Caminhais
mais apressado,
Absorvendo
estes ribeiros
Que em
vós se metem ligeiros,
Vossas
águas engrossando.
Eu ao
longo costeando
Estas
formosas colinas,
Minhas
águas cristalinas
Conduzo
tranquilamente;
Mas por
isto, francamente,
Julgais
ser mais do que eu, nobre?
E
verdade que mais pobre
Eu sou
d'agua; porém ela
Não é
clara, pura e bela?
Vós
causais o medo e espanto
Por
onde passais; entanto
Que eu
com murmúrio sereno,
Regando
mais de um terreno,
Fertilizo
estas campinas
Sem
causar essas ruínas,
Que por
vós causadas vejo;
Antes
sempre benfazejo:
Até que
a minha corrente
Se
confunda, finalmente
N'esse
mar vasto e profundo,
Onde um
dia, sem segundo,
Tocando
os mesmos extremos
Ambos
juntar-nos devemos.
*
Ilustração
de Joba Tridente - 2014
* Não tenho certeza, mas acredito que Marquez de Paranaguá seja
João Lustosa da Cunha Paranaguá (1821-1912),
2º visconde e marquês de Paranaguá. Conforme o Ensaio
Biográfico de Chico Castro, editado pela Câmara dos Deputados - Brasília,
em 2009, ele “atuou durante quarenta anos na política, de 1850 à implantação da
República, em 1889. Deputado à Assembleia Geral de 1850 a 1864, foi eleito, em
1865, senador vitalício, cargo que ocupou até à queda do Império. Entrelaçou a
atividade parlamentar com a de presidente das províncias do Maranhão,
Pernambuco e Bahia e a de ministro do imperador D. Pedro II, tendo sido titular
das pastas da Justiça, da Guerra, da Fazenda, além de ter presidido o Conselho
de Ministros. Nomeado conselheiro de Estado, foi ainda ministro dos Negócios
Estrangeiros”. A minha dedução vem do sumário do Ensaio Biográfico: Paranaguá e a seca de 1877;
Paranaguá e o porto de Amarração; Navegação do rio Parnaíba; Navegação a vapor no rio Parnaíba; A seca no Nordeste. Há também o militar e político Francisco Vilela Barbosa, o 1º visconde
e marquês de Paranaguá (1769-1846). É o que sei sobre o nome do autor.
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