quinta-feira, 19 de março de 2015

Manuel Bandeira: Marinheiro Triste

Gosto muito de Manuel Bandeira. Já publiquei aqui o seu antológico poema Trem de Ferro (1936). Agora, diretamente da Antologia da Moderna Poesia Brasileira - Revista Acadêmica, 1939, edição da Brasiliana Digital-USP, de onde também se encontra a apresentação abaixo..., mais três poemas de mestre. Hoje, Marinheiro Triste. Amanhã, O Martelo. Depois de Amanhã, Maçã.

Manuel Bandeira estreou tardiamente, aos 31 anos, com A Cinza das Horas, pequena coleção de poemas onde se revela ainda a dupla influência parnasiana e simbolista. Dois anos depois, em 1919, publica nova brochura Carnaval, em que, a par de alguns sonetos de caráter parnasiano, anteriores ou contemporâneos da Cinza das Horas, manifesta em outras poesias o cansaço das formas gastas, por ele satirizadas no poema "Os Sapos". Sente-se no poeta um desejo de novos ritmos, mais livres, mais fluidos ("Debussy", "Hiato", "Toante", "Sonho de uma terça-feira gorda", "Epílogo"). Em 1924 editou Bandeira as Poesias, em que reuniu a A Cinza das Horas, aumentada de muitos poemas da mesma época ("Carinho triste" é de 1912) e a Carnaval alguns poemas novos sob o título de O Ritmo Dissoluto. Nestes o poeta já aparece na feição mais ou menos definitiva que lhe é própria e que se confirma em duas publicações posteriores - Libertinagem (1930) e Estrela da Manhã (1936). Sente-se nos seus últimos versos uma certa predileção pelos metros curtos ("Vou-me embora p'ra Pasárgada", "Marinheiro triste", "Canção das Duas índias", "Trucidaram o rio", etc). Em 1937 fez o poeta uma seleção de seus versos - Poesias Escolhidas, Civilização Brasileira.


     

MARINHEIRO  TRISTE
Manuel Bandeira

Marinheiro triste
Que voltas para bordo
Que pensamentos são
Esses que te ocupam?
Alguma mulher
Amante de passagem
Que deixaste longe
Num porto de escala?
Ou tua amargura
Tem outras raízes
Largas fraternais
Mais nobres mais fundas?
Marinheiro triste
De um país distante
Passaste por mim
Tão alheio a tudo
Que nem pressentiste
Marinheiro triste
A onda viril
De fraterno afeto
Em que te envolvi.
Ias triste e lúcido:
Antes melhor fora
Que voltasses bêbedo
Marinheiro triste!
E eu que para casa
Vou como tu vais
Para o teu navio,
Feroz casco sujo
Amarrado ao cais,
Também como tu
Marinheiro triste
Vou lúcido e triste.
Amanhã terás
Quando tu partires
O vento do largo
O horizonte imerso
O sal do mar alto!
Mas eu, marinheiro?
— Antes melhor fora
Que voltasse bêbedo

*
Ilustração de Joba Tridente.2015



Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho (Recife, 19 de Abril de 1886 - Rio de Janeiro, 13 de Outubro de 1968). Professor de literatura, escritor, cronista, crítico literário, tradutor. Manuel Bandeira é autor, entre outros de: A Cinza das Horas (1917); Carnaval (1919); Os Sapos (1922); O Ritmo Dissoluto (1924); Libertinagem (1930); Estrela da Manhã (1936); Crônicas da Província do Brasil (1937), Lira dos Cinquent’anos (1940), O Bicho (1947); Belo, Belo (1948); Mafuá do Malungo (1948); Opus 10 (1952); Estrela da Tarde (960); Estrela da Vida Inteira (1966).

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