A homenagem
do Falas ao Acaso ao escritor e
artista Ashraf Fayadh, cuja obra me
foi apresentada pelo escritor Marcílio
Farias, se encerraria ontem, após a publicação de cinco poemas seus: A Última Fila Para Descendes de Refugiados e Quatro Poemas Curtos e Tristeza Feita de Massa de Pão e Um Espaço no Vazio e O Nome de Um Sonho Masculino. Porém, ao ler uma recente postagem de Farias,
no Facebook, decidi oferecê-la aos leitores, como um reflexivo bônus: Escute Fayadh, do premiado escritor
egípcio Youssef Rakha.
"Escute Fayadh é a tradução livre de um Poema de Youssef Rakha em homenagem ao Poeta
Palestino Ashraf Fayadh, cuja
sentença de morte foi comutada para oito anos e 800 chicotadas. A nova
sentença, fruto do clamor de alguns círculos intelectuais da Europa e dos
Estados Unidos - ninguém no Brasil manifestou-se a respeito... - continua sendo
uma afronta à liberdade de criação, característica de uma cultura desenvolvida
a sombra da ignorância religiosa, da superstição de uma sociedade atolada na
lama das tradições barbáricas, e no texto da intolerância típica dos falsos
reinados." Marcílio Farias.
ESCUTE FAYADH
um poema de Youssef Rakha
em tradução de Marcílio Farias *
Ashraf Fayadh, eu acredito mesmo
Que uma explosão está próxima e
Gostaria de deixar bem claro
Que a chuva está nesse momento
Fazendo piscinas em todas as casas ao longo da costa
Hoje eu vi um homem abraçando um refrigerador
Com as duas pernas dentro d’água
E sua mulher pulando de um
Candelabro para outro como a
Mulher de Tarzan.
Que uma explosão está próxima e
Gostaria de deixar bem claro
Que a chuva está nesse momento
Fazendo piscinas em todas as casas ao longo da costa
Hoje eu vi um homem abraçando um refrigerador
Com as duas pernas dentro d’água
E sua mulher pulando de um
Candelabro para outro como a
Mulher de Tarzan.
A sua cabeça a prêmio, eu acredito,
Continua no seu corpo enquanto a
Bomba marca o tempo
Segundo após segundo enquanto
Cinco por cento do mundo
Não consegue suportar
Tanta estupidez.
Agora a explosão, Ashraf - e eu
Que achava poder escapar dos fragmentos
Pensando que os longos mantos brancos
Fossem fantasmas
Batendo asas para ídolos invisíveis
Num estrondo que
Talvez nos transformasse em
Peixes voadores e os
Prédios em garrafas de
Cerveja não alcoólica com a
Espuma escorrendo farta enquanto rachavam.
E a sua cabeça Ashraf, e a sua cabeça,
E o Homem brandindo a cimitarra sobre ela,
E os espectadores com suas roupas brancas como giz
E o Grande Vale silencioso em pessoa
Como uma espécie de palco
Onde os sem teto da vida
Encenam um texto paraEspantar os circunstantes que dizem
Estar em guerra contra o Terror.
Ashraf, a explosão é na minha mente e
É estranho que não existe engenharia genética
Ou efeito estufa ou
Fissão nuclear, ou,
Também, qualquer homem com
Metade das pernas
Dentro d’água, água bastante
Ou efeito estufa ou
Fissão nuclear, ou,
Também, qualquer homem com
Metade das pernas
Dentro d’água, água bastante
Para afogar esse mundo
Sem qualquer abrigo à vista no litoral...
Sem qualquer abrigo à vista no litoral...
* ilustração de Joba Tridente – 2016
* Nota de Marcílio Farias: O Grande Vale é a
falha geológica que corta o Parque Nacional do Kuwait, atração turística
internacional pelos seus “safaris” onde ricos e famosos matam elefantes e
leões.
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Listen Ashraf
A poem by Youssef Rakha for Ashraf Fayadh
Ashraf
Fayadh, I do believe
the
explosion is about to
and would
like to make clear
that the
rain’s now making
swimming
pools of houses
down the
coast
Today, I saw
a man hugging a fridge
half his legs
underwater and
his wife was
leaping
from one
chandelier to another
like Tarzan’s
woman
Your head, I
believe,
is on your
body now
and the bomb
ticks second by second-
sure! five
percent of the world cannot shoulder
all this
stupidity
Now the
explosion, Ashraf,
and I, had I
been out of range of fragments
would have
thought
the white
cloaks
ghosts
flapping at
unseen things
Its bang
perhaps will
make us into flying fish
and the
buildings to bottles
of
alcohol-free beer
foam spilling
over as they clink
Your head, your
head, Ashraf, and
the man
bending with sword and
spectators
shrubs of chalk and
the Great
Rift itself
a kind of
stage play
that the
homeless on their pavement play
to scare the
freeholders
Here, they
say they are at war with terrorism
Ashraf, the
explosion is
in my head,
and
it is
strange, I believe, that there is
genetic
engineering
greenhouse
effect
that there is
nuclear
fission
and, too,
the man with
half his legs
underwater
Water enough
in the sky to drown the world
and no
umbrellas at the coast
* esta versão inglesa está publicada em Qisasukhra
YOUSSEF RAKHA (Cairo,
1976-) é escritor, jornalista, crítico literário, fotógrafo e um dos poetas
mais importantes do Egito, vencedor do Premio
Larkin de poesia em língua inglesa e do Premio
Chris Ayers de Filosofia. Rakha é o Editor-Chefe da revista egipcia Al-Ahram. Entre suas obras estão duas novelas recentes: Book of
the Sultan’s Seal e The Crocodile.
Para saber mais sobre o autor: al-bab,
Yrakha, Words without Borders.
MARCÍLIO FARIAS é formado e
pós-graduado pela UnB (Universidade de Brasília) em Jornalismo, Cinema e
Filosofia. Em 1989 emigrou para os Estados Unidos. Vive e trabalha entre Natal
(Brasil) e Phoenix-Miami-Boston (EUA). Obras publicadas/poesia: Visual
Field (1996), Watermark Press, MD, EUA; O Livro Cor de Triângulo
Cor-de-Rosa (2007), e Rito para Ressuscitar um Elefante (2010), ambos
pela Scortecci Editora, São Paulo, Brasil. Link: Currículo completo. Poemas publicados no Falas
ao Acaso: Moebius; Mandala; Passado incômodo; (John); Diálogo visto de longe na Praça de Sé.
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