Hoje é o Dia do Saci Pererê e, para homenagear o fantástico na literatura
brasileira, trago o realismo mágico do Cordelista Walter Medeiros em Noite de
Raposas e Manhã de Carcarás, de 2002. Em um texto breve, sobre esta arte
poética, publicado em seu site Poemas de Cordel, o autor
diz que: O Cordel pode ser considerado
como uma poesia narrativa, impressa e popular, conforme definem alguns
estudiosos. Trata-se de uma poesia que só se manifesta através da escrita. Até
porque sua característica mais prática e popular está na forma de expor - que
lhe deu o próprio nome – folhetos pendurados em cordéis. Existem rimas feitas
de improviso que se assemelham aos poemas de cordel, porém aí já ganham outra
conotação: a embolada e outros repentes são exemplos. Desde o Século XV há
registros de folhetos na Alemanha, no Século XVII na Holanda e Portugal, em
forma de “folhas volantes” ou “folhas soltas”. Os estudiosos apresentam
comprovações desta origem para o Cordel. Ele tem uma importância muito grande
para a nossa cultura, pois estimula o dom natural daqueles que fazem rimas
populares.
Noite de Raposas e Manhã de Carcarás (2002)
Walter
Medeiros
Nas
estradas do Nordeste,
temos
muito o que ver:
d’aurora
ao anoitecer,
é um
verdadeiro teste,
que
temos que enfrentar,
pra
poder nos deslocar,
desde o
sertão ao agreste.
Basta
que agora lhe conte
uma
recente viagem,
feita
por estas paragens
de tão
lindo horizonte:
pra
você ter uma ideia,
quem
viajou na boleia
diz que
foi estronteante.
Com
destino a Fortaleza,
Voltavam
de Caicó:
Uma
alegria só,
era tudo
uma beleza.
De
repente, começou
aquilo
que se tornou
numa
estranha surpresa.
Coisa
que só via em lousa,
Um
Doutor apreciou,
quando
bem perto passou
uma
enorme raposa.
Ele até
se esquivou,
mas
firme aguentou
tão
surpreendente coisa.
Depois
veio logo outra
e mais
outras, outras tais,
ele nem
ligava mais,
dizia
que era marota
mas
todos naquele carro
em
estado tão bizarro
diziam
“tá com a gôta”.
De
repente aliviou
e as
raposas sumiram
nenhum
mais eles viram
quando
algo clareou
aí veio
a novidade
em meio
à claridade
que ao
grupo impressionou
Pela
estrada a deslizar,
seguia
o rumo traçado
quase
meio desligados,
para o
Céu foram olhar;
que
cena estranha viram
quando
a vista subiram:
a nuvem
de carcará.
Lembraram
de Hitchcock,
naquele
seu filme lindo,
com os
pássaros seguindo
quem
desse o menor toque;
Mas,
com seus conhecimentos
o grupo
teve momentos
de
diferentes enfoques.
O medo
de virarem presas
criou
uma mente só;
os
carcarás não tinham dó,
no rumo
de Fortaleza,
seguiam
o carro pertinho
e todo
mundo juntinho
testavam
a natureza.
Uns
achavam engraçado,
outros
tinham apreensão,
era
tanta emoção,
tinha
até doutor calado;
mas
parecia eterno,
diziam
que era um inferno
aquele
trecho enfrentado.
Raposas
a carcarás
chamaram
tanta atenção,
que o
grupo com emoção
só
falava sobre paz:
respirando
muito fundo,
pensaram
por um segundo:
─ outra
dessas, nunca mais.
Tanto
que nem mais lembravam
o dia
anterior,
onde no
interior
tiveram
uma agenda brava,
Mas
isso é outra história
que vai
ficar na memória
de
viagem cheia de favas.
Por
aqui vou encerrar,
quero
que tenham gostado
do que
foi aqui narrado
e tenho
que homenagear;
senão,
não tinha histórias,
pois
aqui quem tem as glórias
é
raposa e carcará.
Walter
Medeiros (1953) é
escritor (prosa e verso) e jornalista. Trabalhou em diversos veículos de
comunicação, entre eles a Folha de S.
Paulo, o Estado de S. Paulo, Rádios Cabugi e Planalto, TV Cabugi, Tribuna do Norte e Dois Pontos, tendo colaborado no jornal Movimento. Foi um dos fundadores do jornal cultural Galo, da Fundação José Augusto.
Participou do jornal O Letreiro, do
curso de Letras da UFRN (1976) e do fanzine poético A Margem. Em 1990 publicou Abelardo,
O Alcoólatra, que trata do o dia-a-dia de uma clínica de recuperação de
dependentes químicos. Fonte: Poemas de Cordel.
Ilustração de Joba Tridente.2012
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