Quando criança, a minha nona (vó) benzia toda
a família, e quem mais quisesse, com ramos de alecrim e de hortelã. Havia,
depois, o Seu Zé, um “nêgo véio”. Na minha cidade de Oswaldo Cruz, interior
paulista, pra qualquer precisão, se encontrava um bom benzedor. Estas Orações (de benzeduras) se encontram na
edição digital de Cantos Populares do
Brazil - volume II, reunidos pelo
Dr. Sylvio Roméro (ou Silvio Romero),
editado pela Nova Livraria Internacional - Editora - Lisboa, em 1883. Conservei a grafia
original, inclusive nas notas..., tal
e qual no livro.
Oração contra a espinhela
Espinhela
cahida,
Portas
do mar;
Arcas,
espinhelas
Em teu
logar.
Assim
como Christo,
Senhor
nosso, andou
Pelo
mundo, arcas
Espinhelas
levantou.
*
Oração contra espinha na
garganta
Homem
bom,
Mulher
má,
Casa
varrida,
Esteira
rota.
Senhor
Sam Braz
Disse a
seu moço,
Que
subisse ou descesse
A
espinha do pescoço.
*
Oração contra o soluço
Doente: Que bebo?
Curandeiro: Água
de Christo,
Que é bom para isto.
*
Oração contra o cobreiro
-
Pedro, que tendes?
“Senhor,
cobreiro.”
-
Pedro, curae.
“Senhor,
com que?”
- Agua
das fontes,
Herva
dos montes.
*
Oração contra o argueiro no
olho
Corre,
corre, cavalleiro,
Vae na
porta de S. Pedro
Dizer á
Santa Luzia
Que me
mande seu lencinho
Para
tirar este argueiro.
*
Oração do banho
Nossa
Senhora lavou
Seu
bento filho pr'a cheirar;
Eu me
lavo p'ra sarar.
*
Oração para antes de deitar
Sam Pedro
disse missa,
Jesus Christo
benzeu o altar;
Assim
benzo minha cama
Onde
venho me deitar.
*
Oração do amassar das sezões
Deus
vos salve, laranjeira
Que te
venho visitar;
Venho
te pedir uma folha
Para
nunca mais voltar.
NOTAS: Oração contra a espinha (p. 127, vol. II.) – Esta oração de
esconjuro acha-se na tradição portugueza e hespanhola. O snr. Leite de
Vasconcellos tral-a “Para talhar a dada
no peito.” Pega-se n'um pente, talha-se com o arrepio para cima, no peito
doente, e diz-se:
O bô home me deu pousada,
A má mulher me fê-la cama
Em cima das vides,
Em cima da lama,
Vae-te dada
D'esta mama!
(Ap. Era
Nova, p. 519.)
Nas
Orações populares de Andaluzia, repete-se:
Hombre bueno,
Mujé mala,
Seron roto
Arbarda mojà,
Curarme Ia garganta
Senò San Blas.
(Cantos
populares españoles, t. I, p. 444.)
O snr.
Rodrigues Marin traz a lenda popular colligida em Sevilha, com que o povo explica
este ensalmo. (Ibid., p. 461.) A
mesma lenda é vulgar em Ourilhe, sendo S. Braz substituído por Jesus Christo;
eis a formula:
O Senhor pediu pousada;
Bom homem lhe deu pousada,
E má mulher lhe fez a cama
N'uma grade sobre lama.
Sara peito, sara mama.
(Ap. Romania,
t. III, p. 277.)
Sylvio Vasconcelos da Silveira Ramos
Roméro (Lagarto,
21.04.1851 -18.06.1914): escritor, ensaísta, crítico literário, professor,
filósofo. Roméro foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras em 1897
e escreveu para diversos jornais. Sylvio
Roméro é, entre outras obras, autor de: A
poesia contemporânea e a sua intuição naturalista (1869); Contos do fim do século (1878); A filosofia no Brasil (1878); A literatura brasileira e a crítica moderna (1880);
Cantos Populares do Brasil - vol. 1 e 2 (1883);
Contos Populares do Brasil (1885);
História da literatura brasileira, 2v.
(1888); A poesia popular no Brasil
(1880); Compêndio da História da
Literatura Brasileira (1906). Informações sabre a edição: Portal Brasiliana USP.
*
Ilustração
de Joba Tridente - 2013
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