sábado, 17 de setembro de 2016

Luís Gama: A Borboleta

Aproveitando que no mês de setembro, além da primavera, e ou talvez por isso, o Brasil é tomado por feiras de livros e encontros literários, expondo a velha e a nova literatura para novos e velhos leitores, decidi (re)visitar alguns grandes escritores brasileiros e portugueses, cuja obra pode ser apreciada com prazer e considerações por crianças de qualquer idade. São poemas que remetem à infância, ao campo, aos jogos juvenis..., por vezes até melancólicos no seu saudosismo, mas sempre (e)ternos no registro lúdico de um tempo que já não há. Há muito!

O número de poemas será o de um a três, por autor, e as postagens sempre individuais (um por página) para melhor apreciação de cada obra.  Esta primeira edição contará com mais ou menos 30 escritores pinçados ao acaso em meus arquivos. Futuramente farei uma edição apenas com escritoras.

O abolicionista Luís Gama (1830-1882) teve uma vida digna de um bom palco de teatro e ou de cinema. Nasceu livre, aos 10 anos de idade foi vendido como escravo, pelo próprio pai. Alfabetizado aos 17, conquistou a liberdade e libertou centenas de escravos. Foi jornalista, orador, advogado, autor de obras satíricas e também de poemas líricos, como o tocante A Borboleta. Amanhã, quem também marca de passagem a bucólica paisagem, é o Machado de Assis (1839-1908).



A Borboleta
Luís Gama

Sobre a açucena,
Que no horto alveja,
A borboleta
Mansinha adeja;

Libando os pingos
De orvalho brando,
Que a nuvem loura
Vem salpicando.

Meneia os leques
Por entre as flores,
Que o ar perfumam
Com seus olores.

Mimosos leques
De cores finas,
— Tela formosa
Das mãos divinas,

Ora serena,
Pairando a flux,
Esmaltes mostra
Do brilho a luz.

Ora nas águas
Boiando vai,
Qual folha seca
Que ao vento cai.

Ao vir da aurora
Vai do jasmim
Beijar a cútis
D’alvo cetim.

Ao cravo, a rosa
Afagos presta,
— Que a aragem sopra
E o sol recresta.

Ao por da tarde
Pousa em delírio
Nas tenras folhas,
Do roxo lírio.

E o frágil corpo
Em sono brando,
Que embala a brisa,
Que vem soprando,

Alivio encontra
Na solidão
Ate que d’alva
Rompa o clarão.


*
ilustração de Joba Tridente.2016


Luís Gonzaga Pinto da Gama (Salvador-BA: 21.06.1830-São Paulo-SP: 24.08.1882), rábula (advogado falador e sem formação acadêmica), orador, jornalista e escritor brasileiro, filho de mãe negra (livre), foi vendido como escravo,  pelo pai branco, e só foi alfabetizado aos 17 anos. Conquistou a própria liberdade e atuou expressivamente na libertação de mais de 500 escravos. Considerado o maior abolicionista do Brasil, Luís (ou Luiz) Gama, fundou, em 1864, o jornal Diabo CoxoSatírico e com um viés romântico publicou Primeiras trovas burlescas de Getulino (1859) e Novas Trovas Burlescas (1861). Há bom material sobre o escritor na web: Luis da Gama; Quem foi Luís da Gama; Luís Gama e a Consciência Negra na Literatura Brasileira; O sonho sublime de um ex-escravo; Luiz Gama: um abolicionista leitor de Renan.

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